Dilma confirma o provérbio: "de onde não se espera nada é que não vem coisa alguma"
Dilma foi eleita prometendo um governo novo de ideias novas. E, de fato, tinha condições de avançar neste sentido. Afinal, venceu rompendo um isolamento imposto por sua base aliada e derrotou os dois candidatos mais fortes que o PT enfrentou desde que chegou ao poder em 2002 – Marina e Aécio.
Sua vitória se baseou na promessa de ajuste sem perdas sociais e em um programa mais à esquerda. Para alguns, especialmente no campo militante, parecia que finalmente o PT governaria com povo na rua, sem concessões ao capital financeiro – Marina foi acusada de ser a candidata do Itaú.
Mas já dizia o provérbio: “de onde nada se espera é que não vem coisa alguma mesmo”. Eleita com o apoio militante, Dilma agora segue governando com o pior da política. Tanto que podemos afirmar sem medo: os melhores ministros são os que causaram mais estupefação na militância, ou seja, Joaquim Levy e Kátia Abreu. No mais, há muito da velha política rasteira do toma lá dá cá, tentando comprar um Congresso que se venderá cada vez mais caro e perdendo pelo menos uma fonte de bons quadros, o PSB.
Para entendermos melhor essa receita do imobilismo, vamos ver em detalhes cinco casos. Primeiro as duas melhores escolhas de Dilma – Levy e Kátia Abreu. Depois dois casos de sucesso provável, mas incerto – Jaques Wagner e Kassab. Por fim, o exemplo mais acabado da combinação de fisiologismo e incompetência que grassa nesse governo – nosso amigo de sempre Aldo Rebelo.
Levy e Abreu: as opções eram piores
Para o cenário que se coloca para 2015, era necessário tranquilizar os mercados e o setor privado em geral. Neste sentido, as opções de Lula em 2003 eram melhores: Palocci na Fazenda com uma equipe da PUC-RIO, Roberto Rodrigues na Agricultura e Furlan no Desenvolvimento. Nenhuma opção similar se apresentava para Dilma.
Primeiro, não havia um Palocci, ou seja, uma liderança partidária que conduzisse uma política ortodoxa e a legitimasse perante o PT. Desta forma, as opções eram mesmo colocar um ortodoxo ou um desenvolvimentista na Fazenda. Ora, o primeiro mandato se caracterizou por colocar em prática o receituário desenvolvido pelos desenvolvimentistas brasileiros desde os anos 1990. E foi essa receita que fracassou, principalmente no aspecto fiscal.
O ideal seria uma combinação de austeridade fiscal e planejamento estatal, como fazem os asiáticos. Mas não podemos importar ministros da China ou da Coréia. Logo, é melhor um ultra-ortodoxo que resolva o problema fiscal, como Levy.
O mesmo vale para a Agricultura e o Desenvolvimento. Pode-se discordar de Kátia Abreu, mas ela é uma liderança do agronegócio. Idem para Armando Monteiro. Dilma não tinha líderes modernizantes como Roberto Rodrigues ou Furlan, então pegou o melhor que podia contar. Pelo menos entendem das pastas que comandam.
Wagner e Kassab: talvez dê certo
Do resto pouco se salva. Talvez Jaques Wagner e Gilberto Kassab. O primeiro, na Defesa, tem sido questionado por seu passado sindical e pelos resultados pífios em segurança pública de seu governo na Bahia.
Contudo, os desafios da Defesa demandarão a principal competência de Wagner: sua habilidade de negociação. Os militares têm se isolado desde a redemocratização, e o debate público em torno deles está mais focado no balanço da Ditadura que no papel estratégico das forças para a projeção internacional do Brasil. O ministro precisa construir pontes entre as forças armadas e a sociedade.
Wagner começou bem, ao declarar que quer fazer um balanço do regime militar “sem solavancos” e com foco no futuro. Iniciativas do mandato anterior, como a Política Nacional de Indústria e Defesa, podem ajudar a fortalecer o campo militar e a superar o passado.
O mesmo podemos dizer de Kassab. Pela primeira vez um ex-prefeito com habilidade de negociação assume a pasta. Sua gestão à frente de São Paulo é mal avaliada, mas gerou políticas interessantes como a Lei Cidade Limpa. Ao assumir um ministério responsável por atender demandas de prefeitos de todo o país, um negociador como Kassab pode dar resultado.
Nos dois casos, o tamanho do desafio é o maior obstáculo que podem enfrentar.
Aldo Rebelo dispensa apresentações
Talvez sua única qualidade seja não ser corrupto. Talvez. Mas certamente Aldo Rebelo reúne as outras piores características de um ministro de Dilma: incompetência, indicação política e mediocridade.
Aldo assumiu a pasta da Ciência e Tecnologia. Ele pouco fez nessa área, e o que fez foi um desastre: um projeto de lei proibindo a administração pública de contratar “tecnologia poupadora de mão de obra”. Ou seja, o novo ministro é contra a declaração de imposto de renda pela internet, a educação à distância e o internet banking. Tampouco seu partido se destaca neste tópico: recentemente seu site exaltou as conquistas tecnológicas da Coréia… do Norte.
Se fosse apenas o folclórico, já seria um problema. Mas o buraco é mais embaixo. Não há desenvolvimento econômico sem Ciência e Tecnologia. Foi o investimento nesta frente que fez do Sudeste Asiático a potência eletrônica que é hoje. E, como lembra a anglo-italiana Mariana Mazzucato, enfrentar os desafios ambientais de hoje implica investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento.
Ora, entregar um ministério tão estratégico ao toma-lá-dá-cá político significa relegar Ciência e Tecnologia ao segundo plano. Especialmente quando se poderia contar com boas cabeças sobre o tema dentro de casa, como Glauco Arbix ou Newton Lima. Mais do que a nomeação de Levy, Aldo Rebelo significa o enterro de qualquer expectativa desenvolvimentista no governo Dilma.
Em tempo: os melhores ministros da Ciência e Tecnologia do ciclo petista vieram do PSB: Eduardo Campos (o próprio) e Sérgio Rezende. Dinamitar pontes custa muito caro. Mas foi a escolha de Dilma. Resta esperar 2018.
Paulo Roberto Silva
Jornalista e empreendedor. Mestre em Integração da América Latina pela USP.
[email protected]