A montanha pariu um rato

por Paulo Roberto Silva (24/01/2018)

Quem não entendeu que o modelo lulista faliu foi apenas o militante, cujo entendimento foi obscurecido pela Narrativa do Golpe.

Conta Esopo que um dia uma enorme montanha começou a tremer e a fazer barulho. Imediatamente as pessoas que viviam por perto imaginaram que ela se tornaria um vulcão impetuoso, cujas lavas destruiriam tudo ao seu redor. A montanha tremia, o ruído era insuportável, e rachaduras apareciam em toda a sua borda. Até que ela parou e silenciou. Um ser estranho e selvagem projetava sua sombra contra as paredes, atemorizando quem estava próximo. De repente, este ser sai da rachadura e se mostra ao público: era um rato.

Parturient montes, nascetur mus, a montanha pariu um rato. Em 24 de janeiro de 2018, na cidade de Porto Alegre, a montanha petista pariu um camundongo miserável e feio. Era o julgamento do ex-presidente Lula em segunda instância de um de seus inquéritos. A militância prometia encher Porto Alegre. Na hora H, a cidade estava vazia.

Por trás do ruído insuportável da Narrativa do Golpe, o petismo vem sofrendo um esgotamento político de enormes proporções. A medida deste vazio é o resultado eleitoral de 2016, quando o PT perdeu 60% das prefeituras e se tornou irrelevante nas capitais e no ABC Paulista, onde surgiu. Apesar da ilusão causada pelo crescimento das intenções de voto em Lula, apontado pelas pesquisas, o vazio das manifestações em sua defesa mostra que esse crescimento é frágil.

O PT paga o preço de ter sido governo por 15 anos e, ao final, entregar pedaladas fiscais e Lava Jato (não a investigação, mas aquilo que é investigado). A força do petismo até 2002 era o combate à corrupção e as políticas sociais. Após o mensalão, a ética na política foi substituída pelo crescimento econômico. A falência do modelo lulista derrubou a economia e, por tabela, solapou as medidas sociais por inanição. O cidadão comum entendeu isso muito bem.

Quem não entendeu é o militante, cujo entendimento foi obscurecido pela Narrativa do Golpe. Essa narrativa é uma enorme fonte de insensatez, levando intelectuais razoáveis a suicidar sua raciocínio em nome de medos profundos da psicologia militante. O sujeito que jamais venderia sua alma, por medo, a entrega de graça ao lobista de empreiteira e sua gangue.

O petismo apostou na Narrativa do Golpe para reaglutinar a militância e, desta forma, recuperar a relevância política destruída pelo desastre chamado Governo Dilma. A militância, inclusive a de partidos “críticos” como o PSOL, ajoelhou-se diante do Deus Lula sem pensar duas vezes. Mas a relevância política surge da capacidade de se mobilizar quem não é militante. As eleições de 2016 provaram que essa capacidade está reduzida de forma drástica. O vazio nas ruas em 24 de janeiro reafirma essa crise.

Fato é que não há lenga-lenga de golpe, manipulação midiática, conspiração norte-americana e o escambau que possam esconder a mais dura verdade: o petismo vendeu o céu aos pobres e entregou a maior recessão da nossa história. O resto é narrativa mole para boi (ou militante de esquerda) dormir.

Paulo Roberto Silva

Jornalista e empreendedor. Mestre em Integração da América Latina pela USP.

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