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Aprendendo a argumentar com Lenio Streck

por Alexandre Marques (20/01/2019)

O modo besta do professor Streck argumentar é um indício da situação do poder no país como um todo.

Domingo passado, brincava eu com as crianças na sala quando descobri, pelo Whatsapp, a resposta que o professor Lênio Streck deu aos comentários que Olavo de Carvalho emitira, coisa de meses atrás, sobre uma celebridade universitária norte-americana, o jurista Ronald Dworkin. Bem, eu sou, ou pelo menos era, um bom conhecedor de Dworkin (que estudei por dever de ofício e em cujas ideias nunca vi grande coisa), um constante divulgador (e em certos casos, até defensor) do trabalho de Streck e um admirador convicto de Olavo de Carvalho. “Isso aqui vai ser interessante”, pensei.  Interrompi a brincadeira, coloquei as crianças para uma sessão de hipnose com a Patrulha Canina e me afastei para ler.

O professor Streck tem méritos intelectuais reais, salientados, é verdade, pelo baixo nível da concorrência, mas nem por isso menos seus. Seus livros estão entre o que de melhor se tem escrito no país sobre os problemas de que trata – filosofia do direito, grosso modo – e ele compra boas brigas. Sua campanha contra o que chama de “panprincipiologismo” é justa e bem conduzida. Sem contar fato de que ele não escreve naquela langue de bois penosa que os juristas brasileiros costumam escrever. Por todas estas razões, foi uma surpresa tremenda descobrir quão pornográfico o professor conseguia ser neste breve escrito, no qual exibe, não digo desconhecimento do assunto, mas uma inépcia superior ao conhecimento e até independente dele.

Para ser honesto, foi uma surpresa, mas não uma decepção.  Eu não posso dizer que tenha sido, como leitor, traído pela performance, pois bem sabia eu que o jurista gaúcho tinha lá seus momentos de sordidez. Eu sabia, por exemplo, que Streck já fora pego com as calças na mão tentando tascar uma expressão macarrônica em alemão em uma crítica. Mas quem sou eu para julgar?

O que me chamou a atenção no “comentário ao comentário” não foram erros; não foi inépcia; foi, antes, a exibição de inépcia. Como é possível? Como o membro de uma casta de conhecida destreza nas artes da farofa, do pedantismo, do prolixismo, a casta de Rui Barbosa, podia falhar tanto em mostrar-se sabichão? Há aí certo secreto mistério do espírito do professorado jurídico brasileiro atual que vale a pena considerar, pensei.

O texto de Streck é uma aula de tudo o que não se deve fazer para ganhar o assentimento do leitor. É uma prova definitiva, como se alguma faltasse, de que a cultura jurídica pátria passa por sérios problemas. Era esperado que nosso professor, jurista de profissão versado em problemas hermenêuticos – além de um sujeito inteligente e capaz de excelência intelectual –, tivesse uma ciência mínima de como não passar um vexame. Mas ele a tem tão pouca que seu comentário pode ser lido como uma coleção de exemplos do que não se deve fazer para entender e mostrar que entendeu qualquer coisa em ciências humanas e filosofia.

É assim que eu convido o leitor a acompanhá-lo, como uma demostração do que não se deve fazer quando for criticar alguém, uma série de conselhos com os quais todos podemos aprender, e assim exorcizar um pouco os maus espíritos da picaretagem letrada nacional conjurados pela performance do jurista gaúcho.

Sua credibilidade pessoal pode ser destruída por estratagemas que você utilizar

Os antigos retóricos chamavam ethos à imagem que o autor de um discurso dá ao público de si mesmo. É a credibilidade prévia que uma pessoa dispõe para aquilo que vai falar, à qual lhe dedicamos pelo simples fato de ela ser quem é. É fácil notar a fragilidade intelectual deste recurso – que se manifesta em aspectos superficiais, como trajes, elocução, títulos universitários e argumentos de autoridade –, mas é difícil não reconhecer sua utilidade na economia de nossa atenção, além, claro, de sua tremenda eficácia entre os leitores pátrios. O leitor lembrará do “juridiquês” ou do “economês”, linguagens usadas por especialistas para lembrar a quem os ouve de que eles sabem do que estão falando e o ouvinte não. Pois bem: o uso destas formas de expressão é uma forma de apelo ao recurso do ethos. Quanto a este aspecto, Streck começa o jogo ganho. O professor doutor gaúcho não fala juridiquês, como costumam os membros da classe, mas não precisa; ele tem todos os títulos de credibilidade que alguém poderia desejar.

Mas o que ele faz? Põe tudo a perder tentando desqualificar seu oponente justamente em um quesito em que ele não precisaria. Streck dedica os primeiros dez parágrafos do seu texto mencionando, sob o pretexto de não fazê-lo, algumas frases de Olavo de Carvalho com o objetivo de atingir sua credibilidade. Ele escreve assim:

Não vemos o feminismo como um instrumento de poder da esquerda, além de parecer-nos bizarro alguém dizer que Wittgenstein é um pós-moderno avant la lettre. Também não acreditamos que o MEC seja um órgão de doutrinação marxista de “índole cientificista” (?). Seja como for, não é disso que se trata.

A pergunta é: como pôde lhe passar pela cabeça que este estratagema não seria notado?

O leitor atento terá notado o problema, talvez sem ter a palavra certa para expressar o incômodo: dizer uma coisa sem dizê-la é, em si mesmo, uma figura de argumentação, chamada praeteritio, já identificada por Cícero na Retórica a Herênio, onde é chamada de occultatio, ocultamento. Não há nada de errado com a figura em si mesma, mas quem a usa deve fazê-lo de tal modo que não pareça um malandro de feira. Pois insinuar, dizer sem dizer, é uma forma de astúcia e, como tal, um recurso de gente fraca.

Moral da história: o recurso a praeteritio – ou ainda apophasis ou paralepsis – pode terminar prejudicando a eficácia do ethos, já que ninguém pode parecer credível e astucioso ao mesmo tempo. E é o que acontece. Tivesse simplesmente ido direto ao ponto, a crítica de Streck teria guardado a força de seu prestígio universitário. Ao tentar acrescentar a preteritio de maneira tão desastrada, sem a menor tentativa de encobri-la, ele acaba compondo perante o leitor a figura de um Iago atrapalhado que tenta desqualificar seu oponente com ninharias.

Aqui há ainda outro problema: umas das ninharias que Streck menciona sem mencionar é o já famoso gosto de seu oponente, o “Guru da Virgínia”, pelos palavrões e a maneira franca de expressar-se. Acontece que este jeitão do Olavo de Carvalho é já tão folclórico, tão amado pelos seus milhares de leitores, que se transformou quase um patrimônio cultural, como a voz de Paulo Francis ou os gritos de Galvão Bueno. Ao tentar fazer insinuações justamente a respeito dos palavrões, tudo o que o professor Streck consegue é passar a imagem, cândida e deprimente, de uma garotinha vestida de cinta liga fingido para a câmera que é uma dançarina de pole dance. Para completar, uma vez que o leitor tenha formado na mente esta figura, é quase impossível que os gestos de Streck, que podem ser vistos em suas participações televisivas, não confirmem a imagem. Pois nosso professor gaúcho é um senhor de olhar faceiro que usa o que parecem ser os óculos da esposa, cuja imagem parece traduzir perfeitamente sua preferência por recursos como a praeteritio. Quando se compara esta imagem com a pose do próprio Olavo de Carvalho, que tira fotos de chapelão, se veste de redneck e dá entrevistas fumando cachimbo em seu escritório, o efeito é demolidor. Tudo isso, óbvio, é pura ilusão, e tivessem Streck e Carvalho lançado mão de outros recursos verbais, a imagem televisiva e fotográfica teria outro efeito. Mas aqui estamos exatamente no terreno da ilusão, no qual vale a técnica dos pintores impressionistas: muitos pontos pequenos formam a figura[1].

Se você vive na era do Google, não blefe

No tópico anterior eu comentei como o uso da praeteritio terminava por anular a vantagem que o professor Streck detinha quanto ao ethos. Neste vou mencionar uma forma particular de praeteritio  que ele usa: o blefe. Para quem porventura não saiba, blefe é um estratagema do jogo de pôquer em que o jogador dá a entender que tem cartas que, na verdade, não tem. É uma forma de “dizer sem dizer”, de insinuar, isto é, de praeteritio. Nas diatribes intelectuais, é um dos recursos mais frágeis de todos, que não tem a menor chance de sucesso, a não ser que seja usado perante um público completamente ignorante ou indiferente. Jorge Luis Borges gostava de citar, nos rodapés de seus livros, obras e autores antigos que não existiam, o que é uma forma magistral do uso do blefe. Para um escritor de ficção, funciona muito bem. Como recurso argumentativo de um jurista, não.

Aqui está o blefe de Streck:

“Não vemos o feminismo como um instrumento de poder da esquerda, além de parecer-nos bizarro alguém dizer que Wittgenstein é um pós-moderno avant la lettre.” [grifos meus]

Notaram? Streck diz parecer-lhe bizarro que alguém considere o lógico Wittgenstein um predecessor dos ditos filósofos pós-modernos. Ele o diz, não para expressar uma discordância, mas para dar a entender que seu oponente acredita em coisas bizarras, que é um sujeito fora da realidade. Esta areia no olho do leitor, que normalmente  não entende patavina de filosofia, poderia ter um mínimo de sucesso, não existisse no mundo uma ferramenta chamada Google.

Vai saber o que o leitor médio de Lenio Streck sabe de Wittgenstein. Os poucos parágrafos com que ele inicia sua crítica, porém, são já tão eficazes em minar sua credibilidade que a primeira coisa que fiz – e desconfio que não só eu – quando vi essa tentativa de insinuação foi escrever no motor de busca: “wittgenstein postmodernism”. Dentro de 20 minutos, eu estava conferindo à página 10 do livro A condição pós-moderna, de Jean François Lyotard, que a ideia de “jogos-de-linguagem” de Wittgenstein alguma coisa tem que ver com a filosofia pós moderna, já que é invocada como princípio metodológico por um de seus fundadores.

O professor Streck é desonesto, um safado de marca maior? É um sujeito de quem não se poderia comprar um carro usado? Não podemos saber! Como eu disse antes, estou tratando da imagem que ele passa, não do cidadão, o que não é a mesma coisa. Pessoalmente, me inclino antes pela opinião oposta: alguém que tenta um blefe tão pueril é até inocente. Como pôde ele imaginar que ninguém ia usar o Google para descobri-lo? Mas sigamos.

O estratagema do espantalho deve ser acompanhado de argumentação contra o espantalho, e não deve ser usado sem elementos suficientes

Tendo dedicado a primeira seção de seu comentário a edificar uma imagem paspalha de si mesmo, Streck passa à parte substantiva, o comentário ao comentário de Carvalho. É quando ele poderia ganhar alguns pontos com o leitor. Não o faz de todo mal. Ainda assim, merece alguns reparos.

Diz Olavo de Carvalho, lá pelas tantas em sua aula, que “um texto só requer interpretação se ele não tem um sentido óbvio imediato”. Streck usa esta sentença para associar o professor a uma escola jurídica francesa do século XIX chamada Escola da Exegese, que defendia a mesma tese. No mundo ao qual o professor Streck pertence, existem poucas coisas mais demodé que tal Escola, o que explica a confiança com que ele apelou à associação para destruir seu adversário. É uma forma de mostrar para o auditório que o adversário não tem a menor ideia do que está falando. Até aí, tudo bem, poderia ser uma boa jogada.

Só há um problema. A frase de Olavo de Carvalho nada mais é que uma tradução quase literal de um adágio dos juristas romanos que diz assim: In claris cessat interpretatio. O filósofo não faz nenhuma profissão de adesão a uma escola jurídica em particular. Reconhecer o fato de que existe uma diferença entre a lei e a interpretação da lei é nada mais que expressão do senso comum, e nada do que é dito permite alguém supor que a frase significa adesão a uma escola de pensamento. Mesmo para negar a razão deste princípio, como faz, de fato, a maioria dos autores modernos, é preciso partir dele, tão pregnante é a ideia.

O nome do recurso que Streck se vale é Argumento do Espantalho, que consiste em atacar um argumento que não foi propriamente defendido pelo opositor. Ele ataca a Escola da Exegese cujos membros defendem, entre outras coisas, a tese de que lei e interpretação são realidades distintas que não devem confundir-se –, a qual, entretanto, sequer foi mencionada.

Neste caso, o professor gaúcho quase fez um bom uso do argumento. Ele cometeu dois enganos, porém. O primeiro é que, embora a frase de Olavo de Carvalho se preste sim à associação por ele tentada, ele deveria ter colhido mais elementos, isto é, construído um espantalho melhor — ou então, renunciar ao estratagema. Pois não basta que o sujeito, por exemplo, defenda algum tipo de política social para que seja convincentemente apresentado como socialista; ou que mencione algum aspecto positivo da competição econômica para ser rotulado de liberal. Ele precisa estar comprometido com algo mais do que uma frase isolada. Caso contrário, o argumentador corre o risco de mostrar-se argumentando contra o simples bom senso, do qual toda ideologia possui um pouco. Muitas vezes, percebo esta prudência salutar em alguns articulistas liberais, que evitam apelar ao espantalho do “socialismo” de seus oponentes por receio de, por falta de elementos que deem credibilidade ao artifício, acabarem parecendo estar contestando máximas morais plenamente aceitas, como “os pobres devem ser ajudados”. Eles podem até ser acusados de covardia mas, do ponto de vista da arte da persuasão, a abstenção faz sentido.

O segundo engano é que Streck não ataca a Escola de Exegese com argumentos, como exigiria a técnica bem usada, e sim com um gesto afrescalhado (reencenando o ethos construído na primeira seção do texto), acusando o oponente de ser demodé. Que desgraça! A única razão pela qual o argumento do espantalho é útil é que ele permite quem o utiliza de trazer a argumentação para um campo sobre o qual se possa argumentar. É a precisa razão pelo qual o espantalho é criado: para que o argumentador possa exibir sua doutorice batendo nele. Tendo feito a primeira parte, Sreck omite-se de fazer a segunda, obtendo, com isso, o efeito contrário ao pretendido. Em vez de mostrar para o leitor por que a tal Escola da Exegese é uma coisa medonha, ele se limita a dizer que ela está… fora de moda. Ora pois.

Quando conheceu o clima da universidade brasileira na década de 30, o antropólogo Claude Levi-Strauss não deixou de assinalar, antes mesmo que entrasse em contato com os ritos dos índios Nambikwara, o exótico culto dos professores universitários às modas intelectuais estrangeiras[2]. Algumas décadas depois, Guerreiro Ramos colocou este como um dos principais problemas da vida universitária nacional[3]. Gilberto Freyre reclama da mesmíssima coisa em suas conhecidas memórias. São três exemplos entre dezenas, sem contar o sem número de caricaturas literárias da figura do bacharel sempre atualizado no último grito da moda. Por razões que a razão humana desconhece, nosso jurista gaúcho achou que associar-se a uma figura mil vezes caricaturada – e da qual, ademais, qualquer espírito minimamente sagaz que tenha frequentado uma faculdade de ciências humanas e letras é capaz de reconhecer o ridículo – tem alguma força persuasiva.

Eu poderia continuar, mas concluamos. O objetivo destas observações não foi demonstrar que Lênio Streck está errado e Olavo de Carvalho está certo na interpretação de Ronald Dworkin. Querelas interpretativas não se prestam, a não ser rarissimamente, a uma competição de certo e errado, como sabe qualquer um com alguma experiência na área das humanidades, inclusive o professor Streck. Também não quis pôr em dúvida a honestidade pessoal, que não discuto, nem a excelência intelectual, a qual reconheço, deste último. Não fossem as ideias dele dignas de nota e superiores à de seus pares, seu vexame sequer seria de algum interesse. Mas justamente neste contraste reside a questão. Para repetir uma pegunta feita mais acima: como é possível que um jurista e professor até, vá lá, brilhante, tenha tão pouca penetração psicológica para não notar o papelão que fez?

A resposta a esta pergunta não está necessariamente na moralidade individual do professor Streck nem em sua inteligência ou falta dela, mas na situação de poder da casta letrada da qual ele faz parte. É como um representante egrégio dela que sua diatribe atrapalhada com Olavo de Carvalho tem algum interesse. Ao contrário do que geralmente se pensa, o estudo da retórica ou “logica da argumentação” não tem por objetivo adestrar-se em técnicas manipulativas. Técnicas argumentativas funcionam mais ou menos como a métrica funciona em poesia: ocorrem de modo quase instintivo, principalmente quando o discurso está a serviço da verdade, e só costumam aparecer quando não estão (assim como só notamos a métrica de um poema feio). Em que pese a enorme indústria que existe em torno do assunto, elas tem, neste plano, uma utilidade principalmente pedagógica, e são uma espécie de esquema de autodefesa e autoconsciência intelectual dos leitores.

Em um segundo plano, entretanto, seu conhecimento é um instrumento valioso: o plano da ciência política. Um conhecimento satisfatório da lógica da argumentação dá para quem o detenha uma excelente chave interpretativa dos mecanismos de poder vigente em determinada situação. Quando se considera a realidade do poder que uns seres humanos exercem sobre os outros, juristas, sociólogos e cientistas políticos tradicionais tendem a abraçar visões unilaterais. Ou entendem que o poder é da ordem da pura força física ou da ordem da pura manipulação psicológico-econômica, para nem mencionar os que sequer tentam entendê-lo e se limitam a tentar propagar certos valores. Ou seja: uns são excessivamente materialistas, outros excessivamente intelectualistas, e ainda outros são mais tribunos que propriamente cientistas.

Acontece que os seres humanos governam uns aos outros pelas duas frentes ao mesmo tempo: tanto pelo instrumento da ameaça de violência pura e simples como pela solicitação psicológica. O funcionamento da sociedade exige que força física e manipulação sejam utilizadas, mas exige também que as duas articulem-se entre si de modo a ganhar o assentimento dos indivíduos, o que acontece, essencialmente, através da argumentação (que não é, é bom enfatizar, manipulação). O conhecimento da lógica da argumentação é a única maneira que temos de enxergar a dinâmica desta articulação.

O cartunista americano Scott Adams, autor das tirinhas Dilbert, ganhou grande celebridade em 2016, quando previu, contra tudo e todos, inclusive contra famosos estatísticos, que Donald Trump iria vencer as eleições  presidenciais, fundado exclusivamente em um conhecimento mais ou menos intuitivo da lógica da argumentação. O livro de Adams padece, na verdade, de muitas fraquezas, entre as quais a filosofia barata em que ele se ampara. Ainda assim — e, de certo modo, por isso mesmo — ele é uma prova de quão insubstituível o conhecimento retórico pode ser para a análise política.

A capacidade de avaliar esquemas de argumentação dá acesso à qualidade do poder que determinada elite filosófica possui. O modo besta do professor Streck argumentar é, na verdade, um indício muito significativo da situação do poder no país como um todo. Comentarei mais sobre isto em um próximo artigo.

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NOTAS

[1] Diretores de Hollywood sabem que gestos até efeminados podem, por efeito de contraste com as ações, passar uma imagem de grande perigo e virilidade. Vem-me à memória o terrível Omar, da série The Wire interpretado por Michael K. Williams. Não é exatamente o caso do prof Streck, que não é propriamente efeminado e tampouco transmite qualquer especial dignidade.

[2] “Nossos estudantes queriam saber de tudo, mas qualquer que fosse o domínio, somente a teoria mais recente lhes parecia digna de ser retida. Indiferentes ao grande repasto intelectual do passado […] eles conservavam um entusiasmo sempre disponível pelos novos pratos”. Levi-Strauss, Claude. Tristes Tropiques, Plon, 1955, p. 115.

[3] Em Introdução crítica à sociologia brasileira, Ed. UFRJ, 1995.

Alexandre Marques

Doutor em ciência política pelo IESP/UERJ e professor do curso de ciência política da UFPI.

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