Independência brasileira. Religião e espaço público. Napoleão. Arendt e o totalitarismo. Líbia.
(outros lançamentos que merecem sua atenção, em rápidos comentários – por Daniel Lopes)
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Uma obra para estudiosos e leitores muito interessados no período da Independência. José Murilo de Carvalho, Lúcia Bastos e Marcello Basile resgataram e reuniram 32 panfletos publicados por volta de 1822, que dão uma ideia do clima entre os militantes pela independência brasileira. O volume tem as imagens dos panfletos e a transcrição dos textos, publicados no Rio, na Bahia, em Portugal e de “origem não identificada”. Um texto introdutório de 26 páginas contextualiza os panfletos e explica sua importância. Esse livro é uma pérola para se ler a qualquer hora, em qualquer ordem. / Às armas, cidadãos!, José Murilo de carvalho e outros (orgs.), Companhia das Letras, 2012, 240 páginas
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Os autores de A religião no espaço público não são “ateus militantes” — ou pelo menos não mostram nestas suas colaborações. O livro é da coleção Antropologia Hoje da editora Terceiro Nome. Os autores são, antes de tudo, antropólogos preocupados em relatar estudos de campo que fizeram, ou analisar aspectos históricos em artigos acadêmicos. Eu destacaria o texto de Ronaldo de Almeida — que aliás publicou em 2009 o ótimo Os demônios da Igreja Universal –, “Negócios, poder e fé: a Universal contra a Mundial”, que lida com a rixa cada vez mais áspera entre os dois conglomerados religiosos. Ou melhor, conglomerados político-econômico-religiosos. Para Almeida, não se pode analisar com exatidão os comportamentos dessas instituições como se fossem apenas igrejas. / A religião no espaço público, Carlos Alberto Steil e outros (orgs.), Terceiro Nome, 2012, 216 páginas
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A primeira coisa que chama a atenção na história de Napoleão Bonaparte é o fato deste campeão do expansionismo e da nação francesa ter nascido em sua periferia — Córsega. Vêm logo à mente o austríaco Hitler e o georgiano Stálin, outros dois curiosos casos. Os três homens fortes também se assemelhavam na extrema capacidade de se movimentar para cima na política, quebrando ou inventando regras quando preciso. Mas as semelhanças podem acabar por aí. Ao contrário dos seus colegas do século seguinte, Napoleão foi sem dúvida um espetacular mestre militar, apesar da derrota final.
André Maurois (1885-1967) biografou inúmeras personalidades francesas, como Balzac e Proust. Esta sua história de Napoleão — “biografia ilustrada” lançada pela Globo — é sucinta. Maurois cobre agilmente passagens da vida de Napoleão, que vão desde lances de sorte (como ter atravessado o Mediterrâneo em 1798 com milhares de homens, para ocupar o Egito, sem ser visto no meio do caminho pela poderosa esquadra britânica do almirante Nelson) até suas dores de corno. / Napoleão, André Maurois, Globo Livros, 2013, 160 páginas
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Ninguém tem mais desculpa para não ler. O clássico da inacreditável Hannah Arendt, na tradução de Roberto Raposo, está agora nas livrarias brasileiras em edição econômica. Tudo já foi dito sobre Origens do totalitarismo, de 1951. O livro está dividido em três partes (“Antissemitismo”, “Imperialismo”, “Totalitarismo”) e estas partes, em algumas edições mundo afora, são publicadas separadamente, o que é um erro, porque o impacto da parte que realmente tornou o livro famoso — a terceira, “Totalitarismo” — não é o mesmo se ela não for lida imediatamente na sequência da primeira e da segunda. Isso porque a ideia central de todo o projeto é exatamente mostrar como o totalitarismo aproveita características de tiranias prévias na história humana, mas é ao mesmo tempo algo totalmente novo e absolutamente radical.
Arendt não foi a primeira autora a colocar Alemanha nazista e Rússia stalinista na mesma escala do mal, mas a penetração dessa ideia na intelectualidade ocidental nunca foi mais expandida do que com a publicação de Origens do totalitarismo. Houve muito ataque da esquerda — como pode uma exilada judia ousar colocar o regime stalinista, um dos grandes vencedores da guerra recém encerrada, lado a lado com o regime hitlerista? –, mas as descobertas que foram se acumulando ao longo dos anos 50 e após, sobre a natureza da União Soviética, apenas corroboravam as conclusões de Arendt.
Um dos livros indispensáveis do século 20, escrito por uma de suas observadoras mais sagazes e moralmente íntegras. / Origens do totalitarismo, Hannah Arendt, Companhia de Bolso, 2013, 832 páginas
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Se o livro de Andrei Netto, O silêncio contra Muamar Kadafi, já recomendado aqui no site, é escrito em ritmo de reportagem clássica, Sandstorm, de Lindsey Hilsum, é mais análise do que reportagem. Embora a autora tenha seguido e entrevistado alguns líbios durante e depois da revolta anti-Kadafi, o livro é principalmente uma abordagem por temas de alguns dos principais fatores envolvidos. Exemplos: o capítulo três conta como a ditadura operava no exterior, assassinando membros islamitas e seculares da diáspora líbia; o capítulo seguinte investiga o massacre de 1996 na prisão de Abu Salim; o capítulo nove narra a Batalha de Trípoli.
O livro de Hilsum complementa bem a leitura do livro de Andrei Netto, até no que diz respeito aos locais principais de atuação dos dois repórteres em solo líbio — Netto entrou pela fronteira com a Tunísia, Hilsum pela fronteira com o Egito. / Sandstorm, Lindsey Hilsum, Penguin, 2012, 352 páginas