Kastelo, do grupo Teatro da Vertigem

por Otávio Dias – Sexta-feira, noite, trânsito na Av. Paulista, quase chego atrasado ao SESC Paulista para assistir a “Kastelo”, peça montada pelo Teatro da Vertigem livremente a partir de O Castelo, de Franz Kafka. Quase. Não contava com o trânsito encontrado, saí correndo entre pessoas, atravessando ruas sem olhar pros dois lados, ficando esbaforido. São Paulo tem de tudo (principalmente trânsito) e tem, entre outras coisas, muito teatro; diria que praticamente todas as combinações possíveis podem ser encontradas por aqui.

As montagens do Teatro da Vertigem costumam impressionar e causar estranhamento logo de cara, porque freqüentemente são encenadas em espaços alternativos, fora dos palcos do teatro italiano. Há quem já espere por montagens assim deste grupo; não é de se espantar, já que já usaram como cenário uma igreja na região central de São Paulo (“O Paraíso Perdido”), um hospital (“O Livro de Jó”), um presídio (“Apocalipse 1,11″) e, ainda, o Rio Tietê em um de seus mais poluídos trechos (“BR-3″). Tais espaços não são escolhidos por serem espetaculosos, pura e simplesmente; antes, são um símbolo.

-- Kastelo --

“Kastelo” segue essa linha de uso de espaços alternativos (ou de uso alternativo de espaços, como você escolher). Sendo baseado em livro de Kafka, podemos dizer sem rodeios: a montagem trata de controle; pensando em O Castelo e correndo o risco de chegar perto de um spoiler, podemos concluir que a exclusão também é tema central da peça. Juntando os três pontos,  temos: os atores excluídos do edifício, do prédio, da sala de teatro, atuando sobre balancins e discutindo realidades muito diferentes de funcionários de uma mesma empresa. Todos incapazes de controlar suas vidas, em algum aspecto – desde a mais alta executiva até o ascensorista ou o motoboy; todos tentando exercer algum poder que lhes resta e, com isso, excluindo e podando alguém.

Não é um bom texto, apenas. É uma boa montagem, porque cenário, iluminação, sonoplastia e atores contribuem para uma obra que não se esforça em ter menos que o necessário pra servir à arte. O grupo é cheio de experimentos e de intenção. Se tiver oportunidade, aproveite. Ligue para o teatro (importante, porque as peças do Teatro da Vertigem costumam ter lotação esgotada). É um exercício de sensibilidade que recomendo fortemente. Fiquei preso no trânsito que me impedia de chegar ao teatro, mas fiquei feliz ao ser lembrado de que essa falta de controle faz, cada vez mais, parte da condição humana.

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SERVIÇO
Kastelo
Quando: até 14 de março; quintas a domingos, às 21h.
Onde: SESC Avenida Paulista – av. Paulista, 119, Bela Vista, região central, São Paulo, SP. Tel.: 0/xx/11/3179-3700.
Ingressos: R$ 5 a R$ 20. Estac. R$ 7 por quatro horas mais hora adicional, na r. Leôncio de Carvalho, 98 – convênio.



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