Bresser Pereira parou no tempo
Sua entrevista à Folha pode até ter empolgado a militância petista, mas não responde aos desafios econômicos de hoje.
A entrevista de Bresser Pereira para a Folha mostra que ele ainda está nos anos 1990, se muito. Ao colocar a polêmica econômica em termos de “ódio dos ricos contra o PT”, ele mostra que continua operando na dicotomia capital financeiro x capital produtivo, que marcou a polêmica entre desenvolvimentistas e neoliberais nos governos Collor e FHC.
Claro que a claque não sabe disso. Para ela, é um ” intelectual tucano apoiando Dilma”, como se todos os tucanos fossem neoliberais. Não são, este é um erro que se mantém desde os anos 1990.
Bresser Pereira é um tucano desenvolvimentista, e sua atuação no Ministério da Reforma do Estado, no primeiro mandato de FHC, foi para propor uma reforma alternativa à proposta pelo Consenso de Washington. Ao invés de estado mínimo, estado eficiente, baseado no conceito de administração gerencial, colocada como oposto à administração burocrática (para estupor de qualquer weberiano sério). Claro que, para o corporativismo estatal, dava tudo na mesma.
A formação de Bresser, um importante autor do pólo desenvolvimentistas brasileiro, se deu no diálogo com a CEPAL e o CEBRAP – de onde surgiu sua militância tucana. Construiu uma linha própria, hegemônica na FGV-SP e na Revista de Economia Política, intermediária entre os radicais da UFRJ (Maria da Conceição Tavares e Carlos Lessa) e Unicamp (Márcio Pochman) e os neoclássicos da FGV-RJ e PUC-RIO. E vem dos discípulos de Bresser a ideia hegemônica no primeiro mandato de Dilma de que bastaria reduzir os juros e conceder incentivos fiscais para haver crescimento econômico.
O problema é que a entrevista de Bresser deixa claro que ele não saiu deste modelo, nem o aperfeiçoou. O seu discurso está todo baseado na existência de um rentismo baseado nos juros altos que vive sabotando o crescimento do país. E aponta um processo de desnacionalização da econômica gerado pela abertura econômica. Mas ele é um centrista, por isso precisa defender Levy e seu programa de austeridade.
E está fora do tempo. Por exemplo, falar em desnacionalização depois dos estudos de Arbix e Salerno sobre a internacionalização do capitalismo brasileiro é um sinal. A partir da análise dos capitais brasileiros no exterior, Glauco Arbix e Mario Salerno mostraram que a globalização econômica foi um processo de duas vias: empresas brasileiras foram compradas, mas outras se tornaram multinacionais, como Gerdau, EMBRAER, Vale e outras.
Na entrevista, pouco ou nada aparece sobre as novas relações de propriedade que surgem no capitalismo financeiro pós 1970 – exceto uma menção ao “rentismo” -, o que o faz ignorar questões como governança corporativa e a separação entre investidor e gestor.
A visão de desenvolvimento também é tacanha, financista, passa ao largo da economia do conhecimento e dos ecossistemas empreendedores, que promovem polinização cruzada entre inovação tecnológica, capital de risco e ambiente institucional. Ignora também a economia verde e os desafios da sustentabilidade.
Na boa, ler a entrevista do Bresser Pereira pode até empolgar a militância, mas para entender os desafios do país é uma tremenda perda de tempo.
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Carlos Orsi
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Pablo Vilarnovo
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Armando