A retórica abjeta do partido busca explorar as divisões sociais do país para dominar
Durante a história brasileira, os negros sempre tiveram na maior parte do tempo o peso do Estado contra si. Durante o período colonial, a escravidão que recaía sobre a população trazida à força da África era brutal, e os poucos negros que conseguiam se sobressair diante dessas condições adversas, como Xica da Silva e Henrique Dias, eram sempre às custas de adversidades e de advertências explícitas e implícitas de que aquele não era “lugar de negro”.
Com a independência, em 1822, as coisas não se modificaram muito. Homens como Machado de Assis e André Rebouças, dois dos maiores brasileiros em suas áreas de atuação, conseguiram obter reconhecimento social pela sua competência apesar de serem negros e haver uma carga social negativa pela sua etnia e origem africana em uma sociedade ainda escravocrata.
O século XX, a despeito dos avanços, não foi fácil para os negros do Brasil. Assim como nos períodos anteriores, sua música, religião, danças e formas de expressão foram constantemente perseguidas pelo Estado e constante era a tentativa de “domesticar” o afrodescendente dentro dos padrões de comportamento tidos como aceitáveis para negros, ou seja, colocá-los no “devido lugar”.
Hoje, no Brasil, ainda há um preconceito bastante grande em relação ao negro, mesmo após as lutas do século passado que trouxeram igualdade civil em diversas partes do mundo (tal como o fim do apartheid na África do Sul) e o maior acesso ao consumo e ao ensino. Os negros ainda são os habitantes mais numerosos das áreas periféricas; os que estão em maior número em situação de miséria; os que ocupam os cargos de mais baixa remuneração; as maiores vítimas de crimes violentos; e os que possuem os mais baixos níveis de escolaridade.
Muitos desses negros e pobres, durante o fim dos anos 1990 e primeira década do século XXI, viram no PT um partido que lutava pelos marginalizados. Com uma bandeira de inclusão social, ética política e combate ao preconceito, o partido conquistou, pouco a pouco, amplos setores da classe média, da intelectualidade universitária e camadas das classes mais pobres. Com esse capital político e uma campanha calcada na busca da ética e valores de igualdade social para as classes mais baixas, o partido coroou o discurso de união nacional na “Carta aos Brasileiros”.
Porém, com a crise do mensalão, a bandeira da ética do PT caiu por terra. A solução para se manter no poder foi radicalizar o discurso e ampliar as fraturas que existem dentro da nação. Agora é nós contra eles! O rico contra o pobre! O negro contra o branco! O gay contra o hétero!
Essa retórica abjeta tem como ideal explorar as divisões sociais do país para dominar. O importante é ganhar a eleição, mesmo que à custa de um discurso irresponsável. Um governante ou alguém que deseje governar tem o dever de unificar o país em torno de um programa que inclua nele a maior parte da nação, não pode jogar com as divisões sociais existentes e as aprofundar para se manter no poder. Mas não interessa ao Partido dos Trabalhadores resolver a questão da pobreza. Não interessa ao Partido dos Trabalhadores melhorar a educação. Não interessa ao Partido dos Trabalhadores atacar a homofobia de frente. Não interessa ao Partido dos Trabalhadores vencer o racismo.
Se o PT realmente estivesse interessado na melhoria e ascensão dos negros, teria trabalhado para melhorar as escolas públicas, locais onde a maior parte dos negros estuda. Porém, figuramos nos últimos lugares do ranking da educação mundial. Se estivesse realmente interessado em melhorar a vida dos negros, teria investido em segurança pública, não permitindo o descalabro do país ter quase 60 mil assassinatos por ano, sendo as maiores vítimas negros pobres de periferia.
Se o PT estivessem realmente interessados na melhora dos negros na sociedade, teria pensado em políticas sérias de inclusão social, como recuperação da educação e da saúde, não em paliativos como cotas raciais, que só servem para mascarar o real problema e não resolve nada. De migalhas dadas por governos populistas a América Latina sempre esteve cheia e, de toda sorte, elas nunca levaram seus beneficiários a lugar algum que não fosse a uma maior dependência do Estado.
Se o governo preza pela ascensão do negro, onde estão os afrodescendentes no governo Dilma? E nas estruturas de poder do PT? Ache o negro nas lideranças do partido e no ministério do atual governo (não conta o ministério da Igualdade Racial, que só existe para dizer que há algum negros no poder. A coisa mais relevante que esse ministério fez até hoje foi tentar censurar a leitura de Monteiro Lobato). Mesmo quando coloca negros em posição de destaque, como no caso do Joaquim Barbosa, é sempre para mostrar o quão o partido é generoso, mas caso o beneficiário de alguma forma aja contra os interesses do partido, é logo chamado por militantes de “negro ingrato” e “capitão do mato”.
Pois eu digo que o negro não precisa de assistencialismo. Precisa de cidadania e de ter acesso a uma boa educação para que seus filhos entrem em boas universidades e construam seu futuro. O negro não precisa de um governo que diz o defender, precisa é de segurança para que possa, assim como todos que vivem no Brasil, independente da etnia, chegar com tranquilidade em seus lares e não serem vítimas de crimes impunes. O negro não precisa de um governo que use a bandeira contra o racismo apenas para se eleger.
Os negros, em sua história no Brasil, cresceram, se desenvolveram e influenciaram a cultura em todos os níveis. Chegamos até aqui, não graças ao Estado, mas apesar do Estado. Perseguições, intimidações e assédios de toda sorte não nos subjugaram, mas nos fortaleceram. Não deixemos que um partido, que sorrateiramente fomenta o conflito contra outros brasileiros de cor da pele branca apenas como estratégia de poder, nos domine. Não deixemos de ver no nosso semelhante o que nos une enquanto humanos, não só o que nos diferencia. Não deixemos nos escravizar por meros discursos falaciosos. A realidade é que o PT não luta pelos negros. Luta apenas por si mesmo e para se manter no poder.
Está na hora de nos levantarmos e assumirmos que raça não pode ser argumento eleitoral, e que é imoral tirar proveito político de pessoas negras, pobres e humildes. Queremos todos com cidadania plena, e respeito com nossos impostos, escolas, hospitais e infraestrutura. Dispensamos as migalhas do Estado.
Negros, é hora de se libertar do PT.
Éder Souza
Formado em História pela Universidade de São Paulo.
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