a Daniel Lopes – Elza, a garota (Nova Fronteira, 2009) é o terceiro romance do escritor e jornalista Sérgio Rodrigues. Mineiro radicado no Rio, blogueiro de renome, Sérgio resgata nesse novo livro a trágica história de Elza Fernandes, jovem de 16 anos que foi amante de Antonio Maciel do Bonfim, o Miranda, dirigente do Partido […]
a Daniel Lopes – Elza, a garota (Nova Fronteira, 2009) é o terceiro romance do escritor e jornalista Sérgio Rodrigues. Mineiro radicado no Rio, blogueiro de renome, Sérgio resgata nesse novo livro a trágica história de Elza Fernandes, jovem de 16 anos que foi amante de Antonio Maciel do Bonfim, o Miranda, dirigente do Partido Comunista do Brasil. Bela e aparentemente ingênua, após ser presa e solta pela polícia política de Vargas, Elza seria morta por estrangulamento e enterrada num quintal por membros do PCB no início de 1936, acusada de traição política – denúncia insustentável mesmo à época, o que não impediu Prestes, dito Cavaleiro da Esperança, de selar em carta-diretiva o destino da moça. Porque tal acontecimento rapidamente tornou-se um não-assunto entre a esquerda brasileira, não havia muitas informações facilmente disponíveis sobre Elza, e Sérgio Rodrigues teve que contar com a colaboração de seu lado jornalista para vasculhar documentos que o ajudassem na composição do livro. Os relatos jornalísticos e fictícios se sucedem em Elza, a garota.
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Amálgama – Quando você primeiro tomou conhecimento do caso Elza Fernandes?
Sérgio Rodrigues – Já tinha ouvido falar da história por alto, mas não posso dizer que realmente a conhecesse até ser procurado pela Nova Fronteira com a proposta de escrever um livro-reportagem sobre o tema.
Convenhamos que não é um assunto muito abordado. Ou não era, antes do teu livro. Por que uma história assim interessante, sórdida mas reveladora sob muitos aspectos, caiu no esquecimento?
Basicamente por razões políticas, porque o clima de polarização do século 20, da Guerra Fria e da ditadura de 64 não deixavam espaço para tirar esse tipo de esqueleto do armário. A esquerda não se interessava em falar de Elza por razões óbvias e a direita, que até se interessou, foi tão incompetente e inventou tantas mentiras sobre tudo o que se relacionava à Intentona Comunista que caiu no descrédito.
Em algum momento você pensou em escrever uma não-ficção, ou desde o início a ideia foi colocar a triste história de Elza dentro de um romance?
Bastou começar a pesquisa para que eu fizesse à editora a contraproposta de um romance, que me pareceu a linguagem mais adequada para lidar com o material. Em parte por causa das grandes lacunas que encontrei sobre a história dessa moça e em parte para ter a liberdade de trazer a narrativa até hoje, examinar como aquele Brasil produziu este que está aí.
O livro é dividido em partes em itálico – que contém os frutos da tua investigação jornalística – e outras em fonte normal, que é a ficção em si, que está ali como que pra dar um sentido ao fugidio conteúdo histórico. Você primeiro fez as investigações e escreveu a parte jornalística, ou foi escrevendo as duas partes simultaneamente?
Primeiro fiz a maior parte da pesquisa, sem escrever nada. Quando comecei a escrever, essas duas vozes distintas logo se fizeram presentes. Mas a separação dos blocos, o modo de intercalá-los e a decisão de destacar o ensaio jornalístico em itálico só apareceram mais perto do fim, quando chegou a hora de editar aquele caos.
No post especial Melhores Leituras de 2008, aqui no Amálgama, você disse que leu Austerlitz, livro estranho como todos do W. G. Sebald, enquanto escrevia Elza, a garota (que ainda estava no prelo), e que “talvez fosse inevitável que ecos de Austerlitz ficassem escondidos aqui e ali, atrás de certas esquinas do texto”. Devo dizer que ficaram sim, de fato (enquanto lia teu livro, também lembrei do Boquitas pintadas, do Manuel Puig). Você, que também é crítico, acredita que essa mistura de gêneros é uma tendência contemporânea? Essa tática em geral representa um esgotamento ou uma revigoramento do romance?
Gosto muito de linguagens híbridas, sempre gostei, e vejo com satisfação que talvez isso seja mesmo uma tendência contemporânea. Não acredito em esgotamento do romance. O formato me parece tão genial, tão aberto, que o considero capaz de digerir essas e outras influências sem deixar de ser romance. Qualquer gênero que você misture com o romance, do ensaio histórico à receita de bolo, acaba se subordinando a ele de alguma forma. O romance prevalece sempre – desde que o escritor não erre a mão, claro.
::: Elza, a garota: A história da jovem comunista que o Partido matou ::: Sérgio Rodrigues :::
::: Nova Fronteira, 2009, 240 páginas ::: encontre pelo melhor preço :::
[ foto: Simone Rodrigues/Divulgação ]
Daniel Lopes
Editor da Amálgama.
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