Música clássica versus música contemporânea

Entre tocar de novo a mesma música e compor uma nova, melhor a segunda opção. Assim era no tempo de Bach.

– Estátua de Beethoven –

Dias atrás escrevi aqui pro Amálgama comentando sobre uma crítica de Leonardo Martinelli, na Revista Concerto, à figura representada por André Rieu. Em linhas gerais, argumentei que André Rieu não é uma figura nociva. É apenas alguém aproveitando uma demanda e ganhando dinheiro com música. O que fez meu texto ser um tanto polêmico foi o título (um ataque direto ao Martinelli, por causa de sua argumentação) e a afirmação de que a música clássica não está muito acima de Rieu, ensimesmada num repertório repetitivo e sem sentido cultural contemporâneo.

Ocorre que eu não sabia que além de crítico Leonardo Martinelli também é compositor de música contemporânea. O que não muda nada em relação ao que eu escrevi naquele texto. Como crítico, Martinelli não se assume como compositor nem oferece qualquer defesa da música contemporânea. Continua escrevendo sobre os clássicos como se a música tivesse morrido há séculos.

Basta que se vejam seus textos para o novo número da Concerto (nº 185, julho de 2012): estão lá uma matéria sobre os 35 anos da Cultura FM, um necrológio para Fischer-Dieskau (recomendo o post do Pádua Fernandes, que suspeito ser o melhor texto escrito sobre o cantor em todo o mundo) e uma matéria em conjunto com Camila Frésca tentando ser mais didático do que no texto contra Rieu — trata-se da matéria de capa, “Quem tem medo de música clássica?”.

Além disso, o número da revista traz uma matéria de Camila Frésca sobre o violinista Luiz Filipe Coelho (Luiz Filip, em versão germanófona), uma entrevista da mesma jornalista com o violoncelista Antonio Menezes, um relato/reflexão de João Marcos Coelho sobre um debate realizado no âmbito do 4º Congresso de Jornalismo Cultural e um texto de Júlio Medaglia intitulado “Sustentabilidade cultural” – no qual basicamente o maestro saudosista se queixa da falta de conteúdo a ser veiculado pelas novas mídias que surgem a todo momento.

Volta à cena a questão da minha argumentação, mal compreendida também pelo compositor Leandro Oliveira em texto para o site da Dicta & Contradicta. Citando meu artigo do Amálgama, ele afirma que devo sentir falta de música contemporânea porque moro em Curitiba. Quem está na iluminada São Paulo já a tem de sobra.

Não é disso que se trata: é claro que existe música contemporânea sendo feita, e Leandro Oliveira se queixa de que haja muitas primeiras audições de obras, que também costumam ser as últimas, pois as peças caem no esquecimento.

Música contemporânea é exatamente isso: compor música para o nosso tempo. Depois de tocada a música, o tempo já passou. Entre tocar de novo a mesma música e compor uma nova, melhor a segunda opção. Assim era no tempo de Bach, que compôs uma cantata para cada domingo do ano no período em que foi Kantor da igreja de Leipzig. As partituras de sua música permaneceram inéditas durante sua vida, foram objeto de estudo das gerações seguintes, mas a ideia de recriar sua obra foi coisa de Mendelssohn, em 1824. Estava nascendo ali a “doença do repertório”: tocar música do passado em breve seria mais significativo do que compor música do presente.

Essa doença se acentuou à medida em que alguns compositores entraram numa espiral de complexidade que julgavam ser o único caminho. Crentes em teses de evolução contínua da linguagem rumo a um aumento de elementos harmônicos, formais e timbrísticos – corrente da qual Richard Wagner foi talvez o principal representante –, o principal efeito que provocaram foi o surgimento do maestro e o ocaso do compositor. Hans von Bulow pode ser considerado o primeiro maestro – foi o único homem capaz de realizar o Tristão e Isolda, coisa que nem o próprio Wagner pode fazer. As peripécias do surgimento desta figura, seu desenrolar ao longo da segunda metade do século XIX e início do século XX estão muito bem analisadas no livro O mito do maestro: Grandes regentes em busca do poder, de Norman Lebrecht.

Pano rápido.

Nos Estados Unidos dos anos 1930/40 um novo fenômeno deixaria marcas profundas na cultura mundial. O surgimento da indústria da música clássica. A rigor, ela já existia desde os tempos de Beethoven, o primeiro compositor a viver do mercado editorial de partituras e não ser empregado direto de nenhuma corte ou igreja. Ganhou um novo patamar com a invenção do fonograma e a descoberta do fenômeno Caruso. Mas só se tornaria o que conhecemos hoje quando uma miríade de músicos destacados do cenário europeu fugiram da Europa por causa do nazismo e encontraram acolhida nos Estados Unidos, no exato momento em que a música sinfônica se tornava um fenômeno de massas.

O principal personagem desta história é Toscanini, um maestro que se tornou célebre por divergir de Mussolini, o que lhe rendeu uma posição política incomparável nos EUA, onde já vinha trabalhando para o Metropolitan Opera. De mudança para o novo mundo, Toscanini se tornou um fenômeno inigualável: era capaz de vender milhões de cópias dos discos da sua NBC Simphony tocando sinfonias de Beethoven ou aberturas de Verdi e Wagner. O sucesso discográfico se apoiava nos programas radiofônicos transmitidos nas tardes de domingo – mais ou menos no mesmo horário em que hoje se assiste ao Sílvio Santos, ou ao Faustão. A ironia é que o principal maestro dos Estados Unidos não tocava compositores norte-americanos. E eles existiam. Mas a produção contemporânea (Ives, Copland e muitos outros) já estava condenada a ficar soterrada pelo mercado de música europeia do século XIX.

Na mesma época, Stokowski colaborava com Disney na produção de Fantasia, e Damrosch fazia programas radiofônicos educativos para serem ouvidos nas escolas. Um arguto observador também imigrante, Theodor Adorno, criticava tanto o jazz da era do swing como as pretensões de amplo alcance da música clássica. Ele classificava o fenômeno como fetichismo, aplicando um conceito de Marx para o que ocorre quando o valor de uma mercadoria se dá não pelo seu uso efetivo, mas pelo status que ela é capaz de sugerir. A rigor, música clássica é isso: exibicionismo pedante e culturalmente vazio.

Culturalmente vazio por quê? Porque o maestro se tornou muito mais importante que a música, e o peso massacrante do passado submergiu a produção atual. É claro que grandes indústrias se aproveitam disso, e o dinheiro que Rieu amealha com isso é fichinha perto do que conseguiram fazer os proprietários de empresas como Decca, EMI, Deutsche Grammophon ou Sony.

Há muita música contemporânea em São Paulo? Que bom. Mas não é o suficiente. O repertório do passado vai continuar existindo, e tem o seu lugar. Mas ele não pode ser maior do que a produção contemporânea. Estudantes de música deverão continuar se debruçando sobre os grandes mestres (sou professor de História da Música, trabalho com isso no dia a dia), a educação musical para o grande público passa pelo conhecimento das obras de referência, mas nada disso faz sentido se não pudermos ter ouvidos para uma produção culturalmente significante para o nosso tempo. Os estudantes de música não podem ser condenados à repetição extenuante e infinita do repertório – é isso que está matando a música, e não o pastiche mal feito de André Rieu.

Por outro lado, a composição contemporânea já se libertou há tempos da pretensão de evolução contínua – ninguém poderá compor música sempre melhor que a tradição clássica. Simplesmente podemos fazer música para o nosso tempo. A tradição deve ficar no seu lugar, não se pode pretender que a música mumificada concorra com a música viva.

Aí entra o papel do crítico. Escrever o enésimo comentário sobre uma sinfonia de Beethoven ou procurar os caminhos para aproximar o ouvinte da produção local e contemporânea? A Revista Concerto vai pelo caminho mais fácil – afinal, é a versão brasileira da revista britânica Gramophone, e tem como principal compromisso difundir a indústria fonográfica da música clássica.

A questão se insere numa dinâmica ainda mais profunda quando se trata de um país periférico como o Brasil. Estamos diante do dilema entre perder nosso tempo tentando “alcançar” a Europa e assimilar sua cultura hegemônica ou aprendermos com eles e desenvolvermos nossa própria produção, que faça sentido no nosso meio cultural. Já temos muita coisa importante sendo produzida, faltam uma imprensa especializada e uma crítica musical capazes de darem conta disso.

Preocupar-se com Rieu é desvio de foco. Defender a música clássica também. Que um compositor contemporâneo precise escrever sobre música clássica na Revista Concerto é um péssimo sinal.

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  • Hugo Silva

    Bom texto, André! Novamente e como sempre. Concordo com cada linha.

    Abraço

    • RenatoSG

      Gostei bastante da opinião do André. Não temos que discutir o que é música alta e vulgar, ou o valor da música clássica. Isto é constatar o fracasso. Mas Não podemos esquecer uma discussão que vem da iconoclastia modernista, e a exigência da inovação, que é um sinal da época. Na ideologia modernista (e menos fortemente na pós-modernista) a arte se constrói por uma série de sinais e estruturas quase científicos que só conseguem ser apreciados por uma elite de iniciados. Na ideologia de Adorno, e no ego do artista contemporâneo, o público é vulgar e comum, e merece ser desprezado. Talvez isto explique um pouco porque a música afinada com a nossa realidade não consegue popular.

  • Lana

    Muito amor nesse e no outro texto polêmico. Bons argumentos. Parabéns.

  • http://brasilfranciscano.blogspot.com.br Eugenio Hansen, OFS

    Paz e bem!

    Um pitaco de leigo:
    A música contemporânea
    obtêm espaço
    na produção de trilhas sonoras de filmes.
    Caruagens de fogo (Chariots of fire) e
    Tempo de glória (Glory)
    são dois exemplos.

  • http://euterpe.blog.br/ Leonardo T. Oliveira

    A consciência histórica na música clássica é uma conquista que nos permitiu transitar pela música antiga de maneira mais engajada do que um mero “atraso na moda”, e acho que não deveríamos abrir mão dessa conquista pra que a música contemporânea ganhe o seu lugar. Sim, porque embora eu concorde plenamente que é na música contemporânea que o que chamamos de música clássica pode recuperar, como arte, uma relação verdadeiramente viva com a nossa cultura, é um pouco desconcertante ser encurralado nessa via única, em que ou nos voltamos para a música contemporânea ou o esforço pela música antiga, ainda que de bom grado, estará fadado ao desperdício e praticamente à traição de uma missão.

    Olhando bem pra Beethoven e pra música atual, não haveria espaço pra uma pluralidade? E não digo apenas dos programas dos concertos, mas se mesmo um texto que trata da música antiga é cobrado por não estar falando da música contemporânea, creio que o questionamento por uma pluralidade aqui é urgente.

    Agora, de fato, a repetição do (por muito tempo garantido) repertório padrão hoje passa por um oportunismo, e a inserção da música contemporânea na nossa cultura precisa de um questionamento dessa realidade pra abrir uma disposição mais aguçada nos nossos músicos e então no nosso público. Só soa um pouco radical tentar isso pela via de uma missão que reivindica a verdadeira bandeira da música clássica, ao qual aqueles que não aderem são considerados automaticamente seus prosélitos. Um cenário de pluralidade e de adesão de bom grado à música contemporânea me parece mais agradável, e dá até menos margem de uma interpretação “futurista” do texto.

    E a propósito, o texto registra uma queixa de que a música contemporânea em SP não é suficiente, pois há estreias de obras mas elas logo são esquecidas, não há incorporação de obras na cultura dos ouvintes. E em seguida uma realidade bem parecida é citada com a música no tempo de Bach, como exemplo da nossa prática anacrônica em se apegar à música antiga de um modo que nem Bach fazia. Mas as tais estreias de obras novas que não se repetem em SP não seriam a mesma realidade? Ou o exemplo de Bach não foi dado como um ideal completo?

    • http://andreegg.org André Egg

      Concordo, Leonardo. Há espaço para muitas músicas. Inclusive para André Rieu.

      Só não concordo com a proeminência cultural dos clássicos. Ouvir Beethoven não pode ser melhor do que qualquer coisa, só porque o cara é considerado o maior gênio da composição de todos os tempos. Não é inútil ouvir Beethoven, mas não é indispensável.

      E sim, o exemplo de Bach é dado como positivo. Não acho ruim que uma obra seja executada uma vez e depois não mais. Isso é bom. Nem toda a obra nova vai merecer se tornar clássica. Mas prefiro ouvir uma obra nova do que uma clássica.

      Minha questão é que não acho que São Paulo tenha música contemporânea suficiente, nem nenhuma outra cidade. Vivemos uma hipertrofia de clássicos desproporcional.

      • http://euterpe.blog.br/ Leonardo T. Oliveira

        André,

        Sou parceiro da promoção da música contemporânea, acredito que a sua falta de espaço seja mesmo um sinal incrível da distância injustificável entre a arte musical e a cultura atual (o que está por trás de muitas das inconveniências que a música erudita enfrenta para se firmar como o bem cultural que poderia ser, especialmente quando comparada às outras artes).

        Minha sugestão diz respeito apenas à lógica por trás da sua denúncia dessa desproporção: ouvir Beethoven *ao invés* de música contemporânea? Beethoven ser “o maior gênio musical de todos os tempos” não justifica *ser melhor* ouvi-lo a uma música nova? Eu entendo qual o ponto, mas é que a linguagem exclusiva usada aqui talvez não corresponda de bom grado a como as pessoas agem, que é vivendo em um mundo plural e dando preferência a uma liberdade individual sem os constrangimentos de uma causa cuja petição possa acusá-las de prosélitas (como o tratamento dado ao texto do Martinelli) e que lhes exija sacrifícios que lhes pareçam desnecessários no mundo plural em que elas já vivem. Em outras palavras, a importância da música contemporânea não soa tão bem quando parece depender de uma troca daquilo que as pessoas já amam – uma cultura musical que fala em escolher entre Beethoven e o incerto não tem cara de algo muito experto, especialmente porque, como eu comentei anteriormente, parece desafiar a conquista da consciência histórica que faz com que percorramos músicas antigas de maneira engajada.

        Mas é mais uma questão de abordagem. Ajustando esse tom de exclusividade (que sim, eu sei, só apela para uma ilustração, não é o que você propõe rigorosamente), lembro da abordagem do Greg Sandow que temos trazido ao blog, que apela para a importância da música clássica contemporânea não como uma petição de princípio em si mesma, mas mostrando como vivemos um atraso cultural na música clássica que não tem motivo nenhum para não se permitir se alargar para além das suas fronteiras atuais tão artificiais, contanto que sendo tratada de maneira mais inteligente. Essa é uma abordagem que eu acredito ser muito eficiente, sem a necessidade de interpelar os ouvintes para escolherem entre Beethoven e uma música desconhecida em nome de uma causa, e que não deixa de se conciliar à visão plural e voluntária do nosso mundo.

      • Orlando

        Bom dia André!

        Acho que uma coisa é uma coisa até se tornar outra coisa. A pintura atingiu seu apogeu no início do século XX e, aí também, circa 1960, a pintura, que era uma coisa, se tornou outra coisa. Isto é, tudo que havia para ser feito em pintura já tinha sido feito e, sobretudo, nada se fará, em pintura, melhor do que já foi feito. Logo, a pintura “morreu”. Leda Catunda já não é mais pintura – é objeto.
        Tudo começou a “ruir” com o “Urinol” de Duchamp.

        O mesmo ocorre com a música, hoje em a música contemporânea é algo para iniciados. E no cinema não é diferente – está deixando de ser cinema para virar vídeo game.

        Abs.

        Abs.

  • Hugo Silva

    André,

    Os seus dois textos e suas aparentes preocupações me lembram muito a crítica do filósofo francês Gilles Deleuze sobre o papel castrador da história da filosofia (parecendo uma inspiração zen budista também, da necessidade de crítica e desconfiança para com os mestres) e da necessidade de fazermos filosofia hoje e utilizarmos a história da filosofia como material para fazer filosofia, sempre problematizando-a e extraindo novidades da história (através de recriação dos textos), de modo a que ela não seja uma história morta, mas possa ser viva, concreta.

    Abraço

  • Tiago Ribas

    Pena que sua visão de interpretação musical seja tão superficial que se limita a tomá-la por mera repetição da mesma coisa. MÚSICA é tão mais do que isso. Amo música contemporânea quando bem feita. E amo ouvir o mesmo bom e velho Beethoven em novas interpretações. Uma coisa não exclui a outra, muito pelo contrário. Fica por nossa conta manter a música viva e nos renovarmos com ela. Mumificadas são as cabeças que andam carregadas de preconceitos.

  • http://opalcoeomundo.blogspot.com Pádua Fernandes

    Caro André Egg, muito obrigado pelo elogio, mas espero que tenham sido escritos textos bem melhores do que o meu sobre Dietrich Fischer-Dieskau. Afinal, ele merecia muito mais!
    E a importância do falecido barítono estava não só no fato de ter interpretado excelentemente tantos clássicos, mas também no de ter inspirado tantos compositores contemporâneos.
    Eu não gosto nada de André Rien (isto é, Rieu), mas concordo que ele não é um problema. A revista Concerto, com suas pautas fracas e sua falta de independência, faz parte do problema.
    Abraços, Pádua.

  • Paulo Rios Filho

    André,

    Parabéns pelos teus dois textos referidos, este e o primeiro sobre a crítica de L Martinelli. Fico contente em ver que existe uma massa jornalística lúcida e preocupada com questões do mais profundo interesse da música feita hoje, mesmo que isso tome forma fora da “grande mídia”.

    Ao mesmo tempo, fico muito descontente ao ler os comentários feitos aos seus textos, sempre vindos de pessoas familiarizadas ao metier da “música erudita”. Incrível como a maioria consegue desviar o foco da atenção para a defesa pessoal da conduta de Martinelli ou para a deturpação simplesmente do ponto principal tratado em seus textos, que é a valorização excessiva atrofiadora da repetição da programação do mesmo repertório que consagrou fortunas.

    O problema não está nas grandes obras, no grande repertório, mas em sua valorização exclusiva, em detrimento do repertório atual.

    Este é o ponto dos seus dois textos e, comentaristas, esse é o alvo da crítica de Egg e não Martinelli, exatamente.

  • http://www.myspace.com/osmariojr Osmário E Jr

    Eu li o texto do Leonardo Martinele (Leo) na época, meu ex colega de EMBAP. Compreendo às críticas dele ao André Rieu, diria até que é um tanto óbvia. O problema é que na sociedade doutrinada pelo positivismo empírico induzido pela sociedade de consumo, as coisas mais óbvias são as mais difíceis de serem enxergadas. Adorno já explicou há anos como funciona, mas talvez ele não imaginasse que seria tão incompreendido, pois muitos intelectuais da escola maericana, temerosos em mostrar qualquer faceta marxista, geralmente desacreditam teorias que se aproximam politicamente da esquerda. Mesmo curtindo jazz e Stravinky, eu acredito que Adorno tinha razão, pois a todo o momento o fetichismo pode ser observado em quase todas as apresentações musicais, e isso me prejudica e me incomoda muito enquanto artista afastado da indústria do entretenimento. Só quero finalizar dizendo que iniciativas como a do Leo devem ser incentivadas e nunca oprimidas, já passou a hora de rompermos com as hierarquias invisíveis e austeridade cultural política. Compositores contemporâneos como o Leo ( e como eu), são frequentemente vítimas de preconceitos motivados pelo medo que muitos músicos tem em parecer alienados, a música é livre, é uma coisa só ao meu entender e sentir. As réplicas, como a do professor André, devem ser compreendidas como valorização da discussão sobre o tema e por isso incentivadas. Gente, vamos escrever, o mais importante é não ter medo e não calar diante das coisas que nos incomodam enquanto acadêmicos ou artistas. Alguma besteira pode sair, ou um equívoco, sei lá, mas temos que ter coragem. Abraço a todos! Osmário Jr (Anarquista situacionista e pacifista).

  • http://euterpedespedacada.blogspot.com.br/ Daniel MM

    Realmente essa postura de por certo tipo de música em um altar intocado, e achar que qualquer tipo de interpretação da mesma é um sacrilégio, é realmente irritante. Acho que toda música tem seu espaço, como existem grupos específicos de música Barroca ou Medieval, e concordo que essa repetição, apesar de ter boas intenções, muitas vezes não funciona. O novo sempre causou essa aversão, em todas as épocas, não é de se estranhar que hoje aconteça isso com qualquer coisa nova que vá “ferir” a tradição, os mais conservadores vão sempre acabar reclamando, isso não é novidade na história.
    O que eu sou contra é com as regras criadas e estipuladas, toda essa herança do tempo que se elitizava a música no Brasil.
    Acredito também que parte do conservadorismo vem sim dessa forma também conservadora de estudo, coisa que molda a cabeça dos músicos de “orquestra”, pode observar que o experimentalismo e a música contemporânea ocorre muito em outros campos (como a música eletrônica) e menos na música de “concerto” (não quero usar o termo música clássica). Um estudo da música que respeitasse a música antiga e viesse a buscar também o novo, seria um equilíbrio ideal. Minha opinião. Parabéns pelo texto, gostei muito da sua visão.

  • Osmário E Jr

    Ops pessoal, uma errata no meu comentário! Confundi os Leonardos e percebi que, ao contrário do que eu disse, não conheço o Leonardo Martinele pessoalmente, meu ex colega é outro Leonardo com sobrenome parecido, mas um dia posso vir a conhece-lo, rs. Abraço a todos!

  • Reinaldo Caruso

    Não concordo que Rieu não seja nocivo, mas o ponto principal de discordância aqui é o seguinte: não acho possível classificar a música cronologicamente para determinar sua relevância. Acredito que os sentimentos que Mozart desperta sejam eternos e atemporais tanto quanto o faz a música de Coltrane, Monk, Moacir Santos.
    Rotular a música por sua idade ou relação com o presente, ao meu ver, limita a apreciação e a produção tanto quanto o rótulo “comercial” ou “não-comercial”. Acho que existe música boa e música ruim -ou não música. E a realidade em que vivemos se aproxima muito mais do ruído disforme e da consequente incapacidade de discernir uma frase de um barulho do que da música propriamente dita.
    E acho que quem sempre perde nos debates que ficam ora na esfera meramente estética, ora no âmbito acadêmico, ora no comercial é a audiência. Esta, no Brasil, é despreparada e relegada ao discurso da demanda, o que perpetua o despreparo e a falta de educação musical.
    É essa falta de educação musical que possibilita a existência tanto de um André Rieu quanto de um Michel Teló.

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  • wagner

    “Entre tocar de novo a mesma música e compor uma nova, melhor a segunda opção”.

    Concordo totalmente com essa afirmação, eu, por exemplo, que nem sou compositor, prefiro sentar no piano e brincar com as teclas ao acaso do que tocar alguma coisa que conheço.

    Mas (e é um grande mas), fazer música é uma coisa, é um prazer, ouvir música é outra coisa, é um prazer muito diverso. Dizer que ouvir uma música nova é melhor do que ouvir a mesma música não é verdade necessariamente.

    Qual o problema de se ouvir repetidamente os grandes compositores? Eles não são ouvidos porque são antigos, são ouvidos porque sua música é boa. Muita coisa medíocre deve ter sido composta que nem ficou registro.

    Enfim, não sou contra a música contemporânea, absolutamente, só acho que você torce um pouco as coisas no seu comentário.

    • Luís Itaretama

      Concordo contigo mas não sei se vai concordar comigo. Essa história da “vanguarda”, da “irreverência”, do “inovar acima de tudo” não é sinônimo de qualidade. “Tocar de novo a mesma música” tem efeitos diferentes para indivíduos diferentes. É como a relação afetiva-sexual com a parceira: tem gente que passa 50, 60 anos sem precisar ir ao Boston Medical Group, cultivando a mesma relação, cheio de interesse e gosto; já outros não conseguem passar alguns poucos anos, meses, que já enjoam da mulher. Há inclusive os que mudam de opção sexual por perder o interesse. Concluindo: estou com minha esposa há 20 anos e escuto Beethoven desde que nasci. A propósito, ouvi estes dias um material novo excelente: Martin Codax e suas cantigas de amigo. O cara é bom!

  • silvio d’amico

    Theodor Adorno dizia que “Arte é  magia livre da mentira de ser verdade”. Dizia que o compito atual da arte è introduzir caos na ordem. E ele por “verdade”  intendia dizer o impalpável , e por “ordem” intendia o sistema imposto, a estrutura.
    Agostino (o santo) dizia bem outra coisa, como demonstra sua obra “A Ordem”. Para Agostino a ordem è a estrutura e o fundamento próprio do ser, aquilo que permite a todas as coisas de existir, a dimensão essencial da realidade. Em resumo , ele dizia que “nada esta fora da ordem”.
    A musica do século XX e certas teorias estéticas são, de certa forma, o reflexo repulsivo ao modelo de Agostino? Sim. Mas, na medida em que a musica e a arte contemporânea continuam a “falar” a nos homens, ou melhor dizendo, quando conseguem ainda comunicar uma idéia, não são uma negação do modelo agostiniano, e retornam a conduzir a multiplicidade à unidade, a desordem à ordem. A Ordem não è uma forma de esquema que si reproduz em forma estereotipada; è um recrear proporções e harmonias sempre novas, è uma forma de humana “demiurgia” (invenção minha). Se certas musicas de Stravinskij, de Bartok e outros sobrevivem ao impacto com o publico , é porque descobrem diferentes formas e proporções e trazem um novo tipo de ordem, na desordem, e não porque trazem o caos, como sustenta Adorno

  • http://www.paroquiasaojosedojaguare.com.br Celio amaral

    Gostaria da cifra ou partitura do canto de Maria – Magnificat – Cântico de Maria de Jayme Amatnecks, interpretação de Silvia Suss e Coro Vox Pop, ao violão André Egg.