Pensamento político brasileiro contemporâneo (4/6) – Escola de Frankfurt e social-democracia

Sérgio Paulo Rouanet, Bolívar Lamounier, Carlos Henrique Cardim, Demétrio Magnoli e outros autores.

Fernando Henrique Cardoso

Fernando Henrique Cardoso

1. Escola de Frankfurt

Influenciado por esta corrente de pensamento aparece Vamireh Chacon (nasc. 1934), sociólogo e ensaísta que, em parte significativa de sua volumosa produção bibliográfica, tem-se dedicado ao estudo do pensamento político luso-brasileiro. A seu respeito, escreve Antônio Paim: “Privilegiando os problemas relativos às ciencias do espírito e da cultura, a sua obra insere-se no amplo quadro do Culturalismo, sob o prisma da sociologia do conhecimento e da historiografia dialéctica”[91].

Sérgio Paulo Rouanet (nasc. 1934), diplomata e ensaísta, é também tributário da Escola de Frankfurt, sendo tradutor da obra de Walter Benjamin (1892-1940). Estabelece uma distinção entre ilustração e iluminismo: a primeira seria um fenômeno circunscrito ao século XVIII, ao ensejo do preceito kantiano do “sapere aude”, enquanto que o segundo se projeta historicamente até a contemporaneidade, no esforço crítico da razão em prol de vencer os preconceitos. Para o autor, há valores universais que precisam ser preservados. Em decorrência disso, ele parte para uma crítica ao multiculturalismo, que relativiza o universo axiológico.

Na trilha de concretizar, nos dias atuais, o ideal da transparência proposto por Kant (1724-1804) e desenvolvido, ulteriormente, por autores da Escola de Frankfurt como Jürgen Habermas (nasc. 1929), Rouanet considera que é necessário prestigiar, na gestão pública, o ideal do que hoje se denomina de accountability, ou transparência das contas públicas. A respeito, frisa o pensador: “A prática do caixa 2, cujo principal efeito é subtrair à opinião pública dados sobre quem financia a campanha política dos vários candidatos, sonega informações que permitiriam controlar a integridade dos detentores de cargos eletivos, verificando se suas posições são de fato independentes, ou se são distorcidas pelos interesses dos doadores”.

2. Social-Democracia

Esta vertente de pensamento político conta, no Brasil, com várias figuras, entre as quais podemos mencionar: Fernando Henrique Cardoso (nasc. 1931), Hélio Jaguaribe (nasc. 1923), José Serra (nasc. 1942), Bolívar Lamounier (nasc. 1943), Simon Schwartzman (nasc. 1939), Carlos Henrique Cardim (nasc. 1948) e Demétrio Magnoli (nasc. 1958).

Destaca-se, pela abrangência das pesquisas realizadas, bem como pelo fato de ter inspirado a ação do seu governo como Presidente do Brasil (entre 1994 e 2001), a obra do sociólogo Fernando Henrique Cardoso. Fiel aos pressupostos básicos da Social-Democracia (ênfase em políticas sociais distribuidoras de renda; defesa da livre iniciativa e da empresa capitalista; abertura aos mercados internacionais; defesa das instituições de governo representativo, com pluralismo partidário e respeito pelas liberdades cidadãs; defesa moderada das privatizações, com presença do Estado em áreas consideradas estratégicas e nas agências reguladoras; defesa da contenção do gasto público e da responsabilidade fiscal, mediante o enxugamento da máquina burocrática e o estabelecimento de critérios de eficiência na gestão pública), Cardoso conseguiu, nos seus dois governos, o controle da inflação e o saneamento das contas públicas, mediante o Plano Real, de forma a aumentar a poupança interna e conseguir sortear a crise financeira internacional.

Para Cardoso, a esquerda tradicional ancorou numa visão de radicalismo infantil, embalada pela ideologia marxista-leninista, sem perceber que, após a queda do Muro de Berlim, era necessário, para os partidos considerados progressistas, comprar a causa dos trabalhadores mediante a efetiva reforma do Estado, de forma a garantir o crescimento econômico e a democrática distribuição de renda. Cardoso governou em aliança do seu Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) com agremiações de centro (notadamente o Partido da Frente Liberal, PFL), fato que lhe rendeu injusta e cerrada oposição do Partido dos Trabalhadores e de outras agremiações da esquerda radical.

Do ângulo das realizações acadêmicas, é necessário destacar a obra de Carlos Henrique Cardim, diplomático de carreira e professor universitário. Coordenou, nas Universidades de Brasília e Gama Filho (Rio de Janeiro), ousada proposta de formação política, mediante a metodologia de ensino à distância da Open University inglesa. Este empreendimento contou com a colaboração do então Reitor da Universidade de Brasília, José Carlos de Almeida Azevedo (1932-2010).

Assim, sob a sua coordenação, foram oferecidos dois cursos, em nível de pós-graduação e de extensão, ao longo das décadas de 80 e 90 do século passado: Introdução ao Pensamento Político Brasileiro e Social Democracia, na tentativa de tender uma ponte entre a academia e as agremiações partidárias, mediante a formação de quadros dirigentes para estas. Como realizações de apoio a essas iniciativas de ensino, Cardim presidiu, outrossim, ambicioso programa de edição de obras fundamentais para o estudo da cultura política ocidental.

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leia também:
Pensamento político brasileiro contemporâneo (1/6) – a escola weberiana
Pensamento político brasileiro contemporâneo (2/6) – liberalismo
Pensamento político brasileiro contemporâneo (3/6) – conservadorismo e tradicionalismo

texto preparado originalmente para o acervo do Centro de Documentação
do Pensamento Brasileiro, com sede em Salvador.

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