por Vanessa Souza – A oitava edição da Flip iniciou com conferência de abertura com Fernando Henrique Cardoso e mediação de Luiz Felipe Alencastro, professor da Sorbonne. O tema foi “Casa-Grande e Senzala: um livro perene”. O ex-presidente do Brasil disse ter ficado surpreso ao receber o convite da Festa Literária, ainda que não fosse a primeira vez em que ele era convidado a falar de Gilberto Freyre (1900-1987), já que FHC afirmou pertencer à geração de sociólogos que renovaram o estudo das crenças no Brasil.
Fernando Henrique confessou que criticava a obra de Gilberto Freyre na década de 60 e 70, porque os sociólogos de sua geração queriam o progresso. “De alguma maneira a resistência que tínhamos ao Freyre era da sua visão nostálgica. Não era exatamente um confronto de ideologias, mas valores expressos que se contrapunham”, explicou. Disse que parte dessa “bronca” com Gilberto vinha da ideia de que ele era mais um ensaísta do que um cientista. “E nessa época nós queríamos ser cientistas”.
Décadas depois, Fernando Henrique mostra que repensou seu olhar sobre Freyre. Segundo Cardoso, Gilberto tinha formação literária, mas não era alguém que só desejava escrever ensaios. “Ele era uma pessoa auto-referida, ele acreditava que criou um método. E qual é? É fundamental analisar as transformações históricas para compreender o processo social, utilizar as vivências e a intuição como forma de captar o conhecimento”.
FHC lembrou que Freyre fugiu do formalismo da linguagem acadêmica – o que deu perenidade às suas obras –, onde se escreve para os outros não entenderem. Segundo ele, o estilo de Gilberto é em forma espiral. Círculos onde o leitor perde-se o tempo todo, mas continua a ler levado pelo embalo. “Ele fez livros que não se concluem e teve a capacidade de arrazoar de forma simpática e convincente”.
Sobre o clássico Casa-grande e Senzala, FHC ressaltou que a senzala é parte constitutiva da casa-grande. Segundo ele, Freyre vê isso e vai resgatar a relação das pessoas que fizeram parte desse estilo de uma época.
Em relação às críticas que a obra de Gilberto Freyre recebeu, FHC comentou algumas. Como o fato de Freyre acreditar que a contribuição dos índios foi menor do que a dos negros. Quanto à acusação de Freyre ser antissemita, Cardoso respondeu: “Gilberto Freyre teve afirmações inaceitáveis para todo mundo: esse é mulato, esse é amarelo, esse é judeu. Assim ele seria antissemita, anti-negro, anti-americano. Ele era muito contraditório”, avaliou. Para concluir, FHC disse que Gilberto Freyre permanece porque escreveu bem, rompeu com a tradição da época e criou um mito. “Freyre reconstruiu o concreto sobre como era a vida no Brasil”.
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