A medida traz o aprendizado com a experiência do ensino superior após a reforma do convênio MEC-Usaid.
Tive duas oportunidades na minha vida de lidar com os jovens que estão sendo formados pelo nosso “brilhante” ensino médio #sqn. Nos dois casos, tive contato com egressos do ensino público e privado. Nos dois casos, o que vi foi desesperador.
Por este motivo, vejo com muito bons olhos a proposta apresentada pelo governo Temer de reformar o ensino médio. É a primeira vez que se decide mexer neste período falido da Educação brasileira desde a reforma do ensino técnico de 1997. E já não era sem tempo: enquanto a educação básica vem avançando, ainda que lentamente, o ensino médio decai a olhos vistos. Nem como cursinho pré-vestibular serve mais.
Claro que a opinião pública destacou o fim da obrigatoriedade da educação física, artes, sociologia e filosofia, estabelecendo relações entre isso e o Escola Sem Partido, o que apenas demonstra o barbarismo intelectual do debate político brasileiro.
O que a medida traz de melhor é o aprendizado com a experiência do ensino superior após a reforma do convênio MEC-Usaid – aquela tão odiada pela esquerda, mas que criou o sistema de créditos, obrigatórias e optativas existente hoje nas universidades. Ao adotar este mesmo formato para o ensino médio, traz flexibilidade ao currículo e permite que os temas transversais sejam melhor abordados por meio de disciplinas optativas.
Claro, nada impede que disciplinas optativas como “Criacionismo Aplicado” ou “Construção Social do Gênero” sejam dadas em determinadas escolas. Também não se sabe como um curriculum tão flexível poderá ser organizado em cenário de contenção de verba. Mas uma solução pode ser a permissão para que o aluno da escola A curse disciplinas da escola B que sua escola de origem não oferece. Pode-se especializar escolas em cada uma das cinco áreas de interesse, e permitir que o aluno circule entre elas. Hoje, estudantes de pós-graduação da USP, Unesp e Unicamp já fazem isso.
A flexibilidade permitirá que o aluno se concentre na sua área de aptidão. Ao mesmo tempo, o núcleo básico do currículo pode reforçar os conhecimentos de Português e Matemática, onde o desastre está instalado atualmente. Não é preciso obrigar todos os alunos a conhecerem John Rawls – e hoje eles já não conhecem mesmo – mas eles precisam entender um texto de Machado de Assis. Ou melhor, precisam entender um texto.
Por fim, um alerta: com todo o respeito aos meus amigos da Pedagogia, a experiência recente mostra que as melhores políticas públicas de Educação não foram implementadas por pedagogos. De referências pedagógicas como Paulo Freire, Ester Grossi e Rose Neubart vieram pataquadas didáticas como o sistema de aprovação automática adotado em São Paulo.
As políticas que realmente tiveram impacto positivo, como a municipalização do ensino fundamental, o Ideb e o Fundeb, foram iniciativas de gente de fora da Pedagogia, como Paulo Renato e Fernando Haddad, e foram propostas por organizações da sociedade civil como o Todos Pela Educação. Os pedagogos da academia são contra o Ideb, por exemplo. Portanto, filtrem tudo o que vier deles.
Paulo Roberto Silva
Jornalista e empreendedor. Mestre em Integração da América Latina pela USP.
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