Mais eleitores de Marina mostram-se dispostos a votar em Aécio no segundo turno do que o contrário
No dia 20 de agosto, afirmei num artigo para o Amálgama que ainda era cedo para dizer com plena certeza quem seria o adversário mais competitivo contra Dilma: Aécio ou Marina. Na época, a vantagem de Marina sobre Aécio num eventual segundo turno contra Dilma era muito relevante, e ela conseguia captar mais votos dele do que o inverso. As pesquisas posteriores vinham confirmando esta tendência. No entanto, levantei algumas questões favoráveis ao tucano: a)baixo grau de conhecimento do público significava que iria crescer na reta final, b)bom desempenho de aliados em estados importantes (Bahia, São Paulo, Rio Grande do Sul, Goiás, Pará), c)mais máquina partidária pra reverter tendências e campanhas negativas.
Hoje, as tendências se inverteram. Marina não para de despencar em todos os estratos, perdendo votos para Dilma entre os mais jovens, mais pobres, na classe média baixa, no Nordeste, e para Aécio entre os mais ricos, na classe média alta, no Sul e Sudeste. Nas simulações de segundo turno, o desempenho de Marina já é similar ao de Aécio contra Dilma, mas as tendências são opostas: enquanto a ambientalista cai, o tucano cresce. Ao contrário das afirmações de analistas e jornalistas de que o eleitorado de Marina não votaria em Aécio, mais eleitores de Marina mostram-se dispostos a votar em Aécio no segundo turno do que o contrário.
Diante da artilharia dos adversários, Marina se mostrou politicamente frágil. Se um adversário ataca, e você responde confirmando as suas teses gerais, passando todo tempo a se defender, estará dando a ele o poder de impor as pautas do debate. Em 2010, com uma candidatura menor e com menos tempo de TV, Marina conseguiu colocar em discussão a pauta ambiental. Desta vez, passou seu tempo negando acusações (mentirosas, na maior parte dos casos), sem contra-atacar o adversário. Ao tentar salvar o seu antigo partido e Lula, e focar suas críticas em Dilma, Marina se mostrou mais frágil do que José Serra para aguentar a artilharia petista. O seu discurso contra o dissenso é fraco, porque o consenso é construído posteriormente à escolha da sociedade na sua representação, e não por políticos em campanha eleitoral, que devem nessa etapa mostrar suas diferenças aos eleitores. Marina não conseguiu se diferenciar substancialmente dos adversários, tornando-se frágil, contraditória, fugaz diante do olhar do eleitor.
No primeiro turno, o PT conseguiu impor o viés com que as principais pautas foram discutidas nessa eleição, mesmo o governo tendo muitos índices ruins. A recuperação da avaliação do governo da presidente Dilma deve-se à vantagem no tempo de TV e em inserções comerciais, com o excepcional trabalho de marketing da equipe de João Santana, além do trabalho da militância petista, eficiente na comunicação, seja favorável ao partido ou espalhando boatos e triturando as reputações dos adversários.
Esquecido em terceiro lugar, Aécio foi poupado de críticas mais incisivas, e possui a menor rejeição entre os principais candidatos. Indo ao segundo turno, contará com dois fatores importantes: a)a onda de entusiasmo que uma virada improvável no primeiro turno traz; b)está crescendo de maneira lenta, mas consistente, em todos os estratos; c)será atacado pelo PT no momento da eleição em que ele terá o mesmo tempo de televisão, e o mesmo número de inserções comerciais.
A pesquisa Datafolha da última terça mostrou uma diferença de apenas cinco pontos entre Marina e Aécio (esta diferença já foi de 20). Aécio conseguiu baixar também para nove pontos a diferença entre ele e a presidente Dilma no segundo turno. Vejamos o gráfico de votos por região no primeiro turno:
Dilma lidera em todas as regiões do país, mas em empate técnico no Sudeste e Centro-Oeste. Aécio ultrapassou Marina no Sul, e em outras pesquisas, também no Centro-Oeste. Se o tucano ultrapassar no Sudeste (responsável por 44% do eleitorado nacional), provavelmente estará no segundo turno. Vejamos o gráfico de evolução das intenções de voto nesta região:
Aécio cresceu três pontos nos últimos quatro dias. Se mantiver parcialmente este ritmo de crescimento, provavelmente ganhará a eleição na região, ficando à frente de Marina e Dilma. No interior (60% do eleitorado nacional), onde a força do “santinho” (voto casado) e da intenção dos governadores influencia mais do que nas regiões metropolitanas, Aécio está tecnicamente empatado com Marina. A presidente Dilma possui 44% das intenções de voto, Marina 23%, e Aécio 21%. Há boas chances de Aécio chegar empatado com Marina no dia da eleição, e ultrapassá-la neste impulso final, até pela estrutura partidária.
O tucano já consegue também captar mais votos de Marina no segundo turno do que o inverso, mostrando ser um candidato mais forte para atrair eleitores do terceiro colocado. Vejamos a evolução de votos dos eleitores de Marina num hipotético segundo turno entre a petista e o tucano:
Aécio cresceu 8% neste eleitorado, e Dilma caiu 4%. A artilharia do PT contra Marina provavelmente deixou o seu eleitor mais simpático ao tucano do que à petista. Vejamos a evolução de votos dos eleitores de Aécio num hipotético segundo turno entre a petista e a ambientalista:
A presidente Dilma consegue captar cada vez mais votos de Aécio Neves, caso ele fique fora do segundo turno (25% contra 24%). Em compensação, Marina capta menos votos de Aécio do que o inverso (57% contra 62%). Portanto, ao contrário do que se fala, o eleitor de Marina é mais simpático a Aécio do que o inverso.
Aécio é um candidato mais competitivo do que Marina para enfrentar Dilma pelos seguintes motivos: pela curva ascendente, pela menor rejeição, pela maior capacidade em captar os votos do terceiro lugar, por ter uma candidatura mais coerente, por conseguir produzir mais dissensos contra o petismo, por ter mais estrutura partidária, por ter menos desconfiança de setores importantes da oposição (como o agronegócio), e por fim, pelo fator emocional que sua ida ao segundo turno geraria nos primeiros dias após a eleição.
Marina cresceu cedo demais, e muito distante da eleição. Talvez, porque estivesse ocupando um vácuo. Não é a primeira vez que a chamada “terceira via” cresce em agosto e na metade de setembro, e despenca nas últimas semanas antes da eleição. É preciso observar se esta via que se opõe aos lados que veem polarizando a eleição no país tem força política de fato ou se está apenas ocupando um vácuo. Em 2002, o candidato do PSDB, José Serra, era desconhecido, e quem ocupou este vácuo foi Ciro Gomes, até que a força política da candidatura tucana recuperou seu espaço. Em 2012, na disputa a prefeitura de São Paulo, o candidato petista (Fernando Haddad) era desconhecido, e Russomanno ocupou este vácuo, até o petista recuperá-lo. No Brasil, sempre há algumas movimentações consideráveis na última semana. O eleitor brasileiro é mais sensível ao que está ocorrendo em volta e, como explica Mauro Paulino, não raro muda sua intenção de voto até mesmo na véspera da eleição. Ainda não dá pra saber quem disputará o segundo turno contra Dilma; entretanto, a candidatura tucana é hoje mais forte do que a socialista para enfrentar o petismo.
Elton Flaubert
Doutor em História pela UnB.