Foi o governo Fernando Henrique neoliberal?

Seu governo foi de "terceira via". Ele elevou a carga tributária e aumentou a proporção dos gastos sociais no orçamento, o que jamais aconteceria num governo neoliberal.

FHCCLINTON-E-BLAIR

Em termos gerais, depois da crise de 1929, ascendeu outra perspectiva a respeito das relações entre sociedade e estado, colocando este como organizador da economia, destacando o seu papel na formação de uma malha de proteção social. Formou-se o “Estado de bem-estar social” (welfare state), onde, em parceria com sindicatos e empresas privadas, o estado passava a garantir um conjunto de bens e serviços, além de regulamentar alguns aspectos da vida privada. Alguns destas políticas sociais inspiravam-se não só na social-democracia vinda da Segunda Internacional, como também do socialismo fabiano. Com o tempo, o estado foi inchando e adquirindo mais controle sobre a vida antes particular dos cidadãos.

A social-democracia nasce a partir da crença de que se poderia chegar ao socialismo através da democracia liberal, com reformas graduais da sociedade e do sistema capitalista, sem revolução armada. Eduard Bernstein, um dos seus principais teóricos, defendia reformas de inclusão social que pudessem melhorar gradualmente a vida do operariado, até que ele pudesse obter os meios de produção. O socialismo deveria ser implementado gradualmente, através de disputas eleitorais.

No decorrer do século XX, a social-democracia passa a ser definida pela Internacional Socialista na ênfase dada à construção do Estado de bem-estar social, na ampliação do conceito de liberdade individual (definido também no sentido de não submissão das “minorias”), na justiça social, e na igualdade não só legal, aproximando-se também do keynesianismo (que defendia a intervenção estatal a fim de manter níveis adequados de emprego).

Por sua vez, quase paralelo a esta ideia de socialismo vinda do marxismo, e embrincando-se com ela, temos o socialismo fabiano. Em 4 de janeiro e 1884, fundou-se em Londres, a Sociedade Fabiana, tendo como objetivo a transformação gradual das instituições já existentes, em direção ao socialismo. Opondo-se à luta de classes, os fabianos acreditavam que com o progressivo crescimento da intervenção estatal a partir de avanços legais, haveria mais bem-estar social e a ascensão da classe operária ao poder. Os fabianos eram a favor de mais regulação na economia, de um sistema público de saúde, e a implementação de um salário mínimo. O socialismo fabiano foi uma das bases de fundação do Partido Trabalhista na Inglaterra em 1900. Foram alguns fabianos famosos: H. G. Wells, Bertrand Russell, George Bernard Shaw. Estas são as ideias predominantes na esquerda eleitoral no início do século XX, e estão, junto com o keynesianismo, na base da formação do welfare state.

Quase na porta de saída da Segunda Guerra Mundial, em 1944, os países desenvolvidos reuniram-se em Bretton Woods, nos Estados Unidos, e estabeleceram acordos, criando um sistema de gerenciamento econômico internacional. O sistema Bretton Woods criou uma ordem monetária para mediar as relações entre estados, criando também o BIRD (depois Banco Mundial) e o FMI. A reconstrução dos países no pós-guerra seria feita através do intervencionismo estatal, como propulsor da economia. Logo, a administração pública da economia passa a ser uma das principais atividades do governo, preocupado com taxa de desemprego, estabilidade, crescimento, taxa de juros. O estado passa a ter objetivos de planejamento econômico, buscando o pleno emprego, as regulamentações, e políticas sociais. Há também uma flexibilização da ideia de soberania nacional, com o crescimento das relações entre estados e os fluxos de capitais e mercadorias.

A partir dos anos 1970, o welfare state começa a dar sinais de crise. Nos países mais ricos, ocorre uma crise fiscal por causa do excesso de gastos públicos. A economia extremamente regulamentada também cria dificuldades ao empreendedorismo. Diante destas circunstâncias, o welfare state torna-se insustentável, por suas formas de regulação, organização e controle da reprodução social. A crise mina a capacidade financeira dos governos, causando um desequilíbrio estrutural nas contas públicas e dificuldades incontornáveis para a volta do crescimento.

É neste contexto de crise do Estado de bem-estar social, que ideias liberais voltam à tona, com o rótulo de “neoliberalismo”, apoiado principalmente nas ideias da Escola Austríaca (Mises e outros) e na Escola de Chicago (Milton Friedman e outros). Este termo foi cunhado por Alexander Rustow em 1938, como tentativa de redefinição do liberalismo clássico frente ao contexto mundial do estado regulador. Há muitas discussões em torno da utilização do termo “neoliberal”, principalmente entre os que se identificam como liberais. O termo é utilizado mais por críticos do liberalismo do que propriamente pelos defensores desta doutrina. Mas utilizamos aqui o termo para identificar este movimento político, social e econômico que emerge a partir da crise do Estado de bem-estar social.

Os neoliberais criticavam o desajuste fiscal, a alta carga tributária, e demonstravam que o excesso de regulamentação estatal dificultava a ação da iniciativa privada e a criação de emprego e renda, gerando alta inflacionária pelo aumento da oferta de moeda pelos bancos centrais. Os estados gastavam demais, colocavam moedas sem lastro em circulação, taxavam excessivamente os cidadãos. Assim, houve uma queda da produção e um surto inflacionário. A solução proposta pelos neoliberais para a crise era a redução gradativa do poder econômico do estado, a diminuição da carga tributária, a privatização de empresas públicas (no setor privado, gerariam mais empregos e renda), o livre-comércio, a desregulamentação, a redução dos gastos do governo, o fim da indexação de preços. A intervenção estatal na economia deveria ocorrer num grau mínimo. A sociedade deveria voltar a ser importante de novo.

O governo mais emblemático e que levou a hegemonia das ideias neoliberais foi o de Margaret Thatcher, primeira-ministra da Grã-Bretanha entre 1979 e 1990. Quando assumiu o poder, o Reino Unido passava por uma grave crise econômica. No pós-guerra, entre 45 e 51, as companhias de bens e serviços tinham sido estatizadas, e com o tempo apresentavam graves defasagens tecnológicas. Os serviços oferecidos pelo Estado eram lentos e ineficientes, devido à falta de competitividade, o monopólio e a burocracia. A ineficiência estatal era encobrida com o aumento dos gastos públicos e da carga tributária, mas levava a alta inflacionária. Para combater a alta inflacionária, Thatcher elevou os juros e cortou gastos do governo. Nos anos seguintes, comprou brigas com interesses sindicais e corporativos, flexibilizando leis trabalhistas. Antes de Thatcher, o governo pagava altos subsídios à exploração do carvão, devido à pressão sindical para garantir o monopólio estatal do setor. Ela enfrentou greves com “mão de ferro” e convicções. Em curto prazo, a atividade econômica esfriou e o desemprego aumentou. Mas depois, com os sindicatos enfraquecidos, com o controle da inflação, e ajuste fiscal, a Inglaterra conseguiu atrair investimentos estrangeiros parar tirar sua economia da recessão. O investimento externo triplicou. Sem Thatcher, a Inglaterra teria afundado na crise.

Uma das grandes contribuições de Thatcher foi dissociar o interesse do governo do interesse do povo. O estado é uma enorme burocracia com interesses próprios e, em muitos casos, opostos aos do cidadão comum. Enfrentar estes interesses nocivos da burocracia foi um dos seus motes, uma contribuição indelével contra o estatismo e os males da coincidência entre poder político e econômico.

O período Thatcher não foi só acompanhado de transformações no Reino Unido, mas influenciou todo o mundo, num momento de reparação do estatismo. Nos anos 80 e 90, tivemos o governo de Ronald Reagan nos Estados Unidos, a queda do Muro de Berlim, a decadência do sistema estatal soviético, a abertura comercial da China comunista, a vitória de vários governos de direita na Alemanha, Austrália, Nova Zelândia, França, entre outros países. O neoliberalismo predominou no período de globalização da década de 90, dando mais racionalidade à administração pública, menos intervencionismo, mais liberdade econômica. Em termos gerais, a ascensão do neoliberalismo se caracteriza pela redução da intervenção do estado na economia, pela exaltação do livre-mercado, por uma política econômica monetarista, pela defesa das privatizações e modernização institucional, pela redução da carga tributária, pela desregulamentação da economia, pelo combate aos interesses corporativos e sindicalistas e, em alguns casos, pela eliminação do salário mínimo. Em todo o mundo, o neoliberalismo uniu admiradores e críticos. Estes, afirmam que nem sempre o índice de pobreza acompanhou o crescimento da economia, ou ainda que os gastos sociais foram substituídos pelo incremento dos gastos militares. Há discussão sobre a culpa das políticas neoliberais no surgimento do subprime e dos derivativos, que maquiaram a bolha especulativa. Por outro lado, os liberais afirmam que as reformas chamadas de “neoliberais” foram insuficientes e que os governos fracassaram em áreas fundamentais.

Seja como for, o neoliberalismo inaugurou um novo período econômico incontornável (como também o keynesianismo), de preocupação com endividamento crescente dos estados, com ajuste fiscal, com política monetarista, com a consciência de que a iniciativa privada é mais eficiente, com a importância do desenvolvimento tecnológico, pela quebra dos interesses corporativos da burocracia. De tal forma que os partidos de esquerda da Europa tiveram que se adaptar a estre triunfo, a partir da queda de políticas econômicas estatistas e da derrocada da União Soviética. Em 1995, quando o Partido Trabalhista inglês volta ao poder, o primeiro-ministro Tony Blair precisou alterar o programa histórico do seu partido, inaugurando o novo trabalhismo.

Tendo que lidar com este novo contexto, há o surgimento da “terceira via” no seio da social-democracia. O sociólogo britânico Anthony Giddens em seu livro A terceira via: A renovação da social-democracia, afirma que a terceira via é a social-democracia modernizada. Em termos gerais, ele defende a aplicação do liberalismo econômico com conceitos social-democratas. Uma espécie de liberalismo social.

Nesse sentido, o conceito de terceira via, passou a ser utilizado para identificar uma centro-esquerda moderna, que tem consciência da racionalidade econômica a que a administração pública deve estar servindo, com controle dos gastos públicos, privatizações necessárias e política monetarista, embora, ao mesmo tempo, continue com agências regulatórias, e aplicando políticas sociais de distribuição de renda, além de políticas culturais socialistas ou progressistas.

Esta é a esquerda que chega ao poder nos anos 1990, num contexto de supremacia do neoliberalismo. O thatcherismo obriga a uma mudança econômica nos partidos de esquerda, mas não em todo o resto do seu ideário. Neste cenário, a esquerda sobe ao poder com Bill Clinton nos Estados Unidos, Tony Blair no Reino Unido, Felipe González na Espanha, e Fernando Henrique no Brasil.

As políticas tradicionais da social-democracia tinham levado a uma elevada carga tributária, ao excesso de regulamentação das relações trabalhistas e no crescimento do déficit público. O capitalismo pós-industrial e o aceleramento da globalização elevaram estes cultos, dificultou o desenvolvimento tecnológico em países que adotavam políticas muito estatizantes, sendo dominados por interesses corporativos e sindicais. No entanto, a esquerda criticava o custo social trazido pelas políticas neoliberais. Era preciso adequar a social-democracia aos novos desafios do capitalismo. O caminho encontrado pela terceira via era unir uma política econômica austera e responsável com uma política social e cultural progressista.

Em 1998, o então primeiro-ministro britânico Tony Blair e o presidente americano Bill Clinton convocaram uma reunião internacional para discutir novos caminhos para a social-democracia no século XXI. Estiveram presentes vários líderes de esquerda: Lionel Jospin, Gerhard Schröder, Massimo D’Alema, Antonio Guterres, Ricardo Lagos e Fernando Henrique. A ideia era adequar a esquerda ao mundo globalizado e ao que ficou de hegemônico no neoliberalismo. Este caminho foi especialmente adotado no Brasil durante o governo de Fernando Henrique Cardoso e na consolidação do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Em 1995, FHC assume a presidência do país, não sem antes cuidar da economia no governo Itamar Franco.

No Brasil, foi o estado que formou a nação. A literatura sociológica é vasta no estudo deste aspecto. Nossa cultura autoritária sempre andou de mãos dadas, na democracia ou na ditadura, com o estatismo. Os surtos de desenvolvimento sempre vieram da mão propulsora do estado, de Vargas à ditadura de 64, passando por Kubitschek. Para direita e para esquerda, o estado deveria ser o motor do desenvolvimento. Nosso estado de bem-estar sempre ocorreu em termos relativos, sendo mais assistencialista e patrimonialista do que efetivamente de políticas públicas, com entrada e saída. Durante todo século XX, houve um processo de inchaço na máquina estatal, com tensão nas contas públicas. Nossa crise fiscal remonta aos anos 1950, e a ditadura militar (mais estatizante do que liberal) apenas reprimiu um processo inflacionário em marcha.

Nada de muito diferente ocorreu no governo Sarney, onde os planos econômicos se sucediam sem atingir a causa do problema, tentando indexar preços, controlar o câmbio, entre outras receitas improdutivas. Tratava-se a inflação com mais crise fiscal. O congelamento de preços, com posterior represália e fiscalização, só levava a um consumo acelerado, sem que a produção a acompanhasse, gerando desabastecimento e a volta da inflação. Em resposta a isto, tentou-se resolver o problema da falta de carne, por exemplo, com o confisco de bois, como se o problema da inflação fosse falta de autoridade e regulação do estado. No final do seu governo, a inflação encontrava-se em 80% ao mês. No governo Collor, o confisco generalizado de ativos monetários apenas aprofundou o problema. Há décadas o país vivia num círculo inflacionário, mesmo sem guerras ou catástrofes naturais. Acumulamos em quinze anos mais de vinte trilhões de inflação, ocasionando uma tragédia distributiva, aumentando perversamente a concentração de renda e a pobreza.

Em 19 de maio de 1993, o social-democrata Fernando Henrique assume o Ministério da Fazenda do governo de Itamar Franco. Fernando Henrique reúne uma equipe de economistas mais ligados às tendências liberais, como Persio Arida, André Lara Resende, Pedro Malan, Edmar Bacha, Gustavo Franco, entre outros. E junto com integrantes do seu partido, como Ciro Gomes, Mário Covas, José Serra e Tarso Jereissati, costura um acordo político para dar sustentação ao plano, pois ele rompia com diversos interesses entranhados na máquina pública. A introdução do Plano Real significava uma ruptura histórica com a cultura de financiar investimentos com inflação e sem ajustes fiscais. Para o plano dar certo era preciso também seguir uma política monetarista, de enxugamento da máquina pública, de cortes orçamentários, de ajustes fiscais, além do fim da indexação. Controlava-se apenas o câmbio.

Mais do que um plano econômico, o Real foi um imenso projeto de reconstrução e modernização das instituições no país, rompendo com vícios políticos, corporativos e sindicais. Neste sentido, a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal foi um grande avanço na modernização da gestão pública no país. Fernando Henrique conduziu um governo de reformas: administrativa, fiscal, tributária, previdenciária. Por vezes, estas reformas eram mais remendos: um pouco liberais, mas nem tanto assim. O presidente se mostrou um grande líder, pois foi caso único em nossa história republicana, onde as reformas estruturais foram feitos sem ditadura (como no Estado Novo ou na ditadura de 64). A costura política feita com um partido de centro-direita, como o PFL, mostrou-se um grande acerto.

A vitória do plano real e o controle da inflação foram sem dúvida demonstrações de vitória dos liberais, ou dos “neoliberais”, mas isto estava longe de tornar o governo Fernando Henrique neoliberal. Na verdade, seu governo foi semelhante aos da terceira via de sua época, como o de Blair no Reino Unido, Clinton nos Estados Unidos, Ricardo Lagos no Chile, e Felipe Gonzáles na Espanha. O liberal histórico Roberto Campos dizia que o ímpeto do governo FHC era correto, mas que suas mudanças eram lentas e distantes do ideário liberal, definindo-o dessa maneira numa entrevista a Roberto D’Ávila em 1997: “Ele é um pós-marxista, que respeita a economia de mercado, porém não a ama. Eu gostaria que ele merecesse a acusação de neoliberal. Ele ainda tem um tremendo sotaque dirigista”.

Fernando Henrique formou-se numa tradição heterodoxa, e assume um país num contexto em que era preciso fazer reformas e modernizações institucionais. Era preciso introduzir uma política monetarista, um tripé macroeconômico (autonomia do Banco Central para conseguir meta da inflação, câmbio flutuante, e responsabilidade fiscal), e abrir o país ao capital estrangeiro, pois traziam juntos poupança, tecnologia e acesso a mercados externos. Ele aceitou certo ideário econômico hegemônico, mas não faz um governo neoliberal. Em seu livro A arte da política, ele afirma que nunca se rendeu ao mercado (leia-se: neoliberalismo). Como se sabe, o câmbio flexível é uma característica dos governos neoliberais. E esta medida só foi tomada pelo governo Fernando Henrique em 1999 por força das circunstâncias (crise). A paridade cambial artificial com o dólar junto com os juros altos criou um processo de desindustrialização do país e perda de empregos. Jamais um governo neoliberal deixaria por tanto tempo o câmbio dessa maneira (o Real já havia sido implementado há cinco anos).

Quanto às privatizações, um governo que não seja neoliberal também pode recorrer a elas (foi assim nos Estados Unidos de Clinton, na Espanha de González, etc.), a menos que seja a favor do estado total. As privatizações foram feitas no Brasil seguindo uma lógica arrecadatória estatal, com a finalidade de pagar a dívida pública, que ia de encontro ao que foi realizado no Reino Unido e em outros lugares. A ideia era vender as estatais ao maior preço possível, garantindo tarifas reajustadas de acordo com a inflação, dando um retorno garantido e constante ao estado. Um governo neoliberal teria se preocupado menos com a arrecadação do estado, e mais com os ganhos de produtividade e competitividade, beneficiando o consumidor, gerando crescimento, emprego e renda. Num governo neoliberal, certamente ocorreria também a privatização da Petrobrás e de um dos bancos públicos, de preferência a Caixa Econômica, além das companhias geradoras de energia. A verdade é que o governo Fernando Henrique adotou fórmulas intermediárias no processo de privatização.

Os governos neoliberais também sempre foram marcados pela redução da carga tributária. No Brasil de Fernando Henrique, a carga tributária foi de 28,9% do PIB para 35,8% do PIB, aumentando consistentemente ano após ano. Além disso, houve a criação de várias políticas sociais da social-democracia, com viés de política pública e não assistencialista. Antes, as políticas sociais eram intermediadas pelo poder público local, com doações de cestas básicas, entrega de leite, distribuição de água na seca. Fernando Henrique introduziu uma rede de proteção social para combater a pobreza, com ações públicas coordenadas.

Os relatórios de desenvolvimento social da ONU mostram que o Plano Real foi por si só o maior plano de inclusão social da história do país. O nosso IDH voltou a evoluir a partir de 1994. Houve a regulamentação de fundos de financiamento para os programas sociais, como o FNAS (Fundo Nacional de Assistência Social), o FUNDEF e o FNS, que permitiu a criação do SUS, além do Fundo Nacional de Combate e Erradicação da Pobreza. No seu mandato, a participação dos gastos sociais no orçamento federal passou de 23% para 28,3%, ao contrário do que ocorre em governos neoliberais, que estão mais preocupados no incentivo a livre iniciativa das pessoas. Ele foi também o responsável pela criação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), voltado à transferência de renda a famílias carentes, para eliminar a necessidade do trabalho infantil. Além de vários auxílios, como o Bolsa Escola (de 1997), o Bolsa Alimentação (de 2001), o Auxílio-Gás (de 2000), e pela unificação dos cadastros sociais. Além do Cartão Cidadão (em 2002), que permitia o saque direito na caixa, sem passar por intermediários.

O governo Fernando Henrique, como a terceira via de sua época, buscou unir alguns pontos das políticas econômicas liberais, com todo o resto do ideário social-democrata, incluindo nisto não só os programas sociais já citados, como a maior interferência do estado na vida privada. As próprias reformas econômicas foram guiadas pelo dirigismo estatal, buscando eficiência e mais arrecadação. Foram cometidos erros estratégicos, como a abertura econômica insuficiente, mas é bom lembrar-se das turbulências internacionais, como a crise no México, na Ásia, na Rússia e na Argentina. Contudo, é inegável o seu papel de reformador de nossas instituições.

São os tucanos de direita?

Depois de doze anos de PT no poder, o PSDB se tornou o principal guarda-chuva de quem se opõe ao petismo. E esta oposição é bastante variada. Hoje, dentro do PSDB há pessoas de direita e esquerda, há técnicos gerenciais, há políticos não definidos, e caciques fisiológicos como em qualquer outro partido. Mas a elite dirigente tucana é basicamente de centro-esquerda. Há poucas diferenças entre ela e a de partidos da centro-esquerda europeia, como PSOE (Espanha), SPD (Alemanha), ou Labour Party (Reino Unido). O seu principal dirigente, Fernando Henrique, continua ligados aos think tanks destes partidos, a novas reuniões sobre a terceira via, ao Council on Foreign Relations, ligado ao partido Democrata americano.

A candidatura de Aécio Neves, embora abrigue conservadores e liberais pelas circunstâncias históricas, é basicamente um retorno à terceira via. O seu discurso orbita em torno de um “estado necessário”, e de um retorno ao tripé econômico do governo Fernando Henrique, ao mesmo tempo em que avança em questões sociais, até mesmo com mais regulamentação a respeito da vida privada. Em economia, Aécio é um pouco mais liberal do que Fernando Henrique, mas é tão progressista quanto este noutras questões. O líder do grupo gay da Bahia, Luiz Mott, já declarou apoio ao tucano nesta eleição. A sua candidatura é mais uma coalizão entre conservadores, liberais e social-democratas contra o petismo — que, por sua vez, explicarei num próximo texto.

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  • junior

    Após começar a ler sobre politica e entender ideologias politicas, sempre fui favorável ao liberalismo econômico. Acho mais funcional que outras ideologias e lendo o livro Arte e Politica do Fernando Henrique você consegue entender seu ponto de vista.
    Agora tenho uma pergunta: Por que professores odeiam em sua maioria o PSDB e partidos de direita?
    Muito bom o site.
    Abraços.