Surpresas podem acontecer em estados que são, em tese, democratas ou republicanos. Chamo atenção para Michigan e Alaska.
Na terça-feira, 8 de novembro, conheceremos o nome do próximo presidente e vice-presidente americano. É a 58ª eleição presidencial do país. Em alguns estados, a eleição já começou. Neles, o eleitor poderá optar por votar antes da terça-feira. Como o dia da eleição não é feriado nos Estados Unidos, o voto antecipado é uma maneira de facilitar o acesso, mas também gera deturpações. Quando o FBI reabriu a investigação contra a candidata Hillary Clinton, centenas de milhares de votos já haviam sido depositados nas urnas.
O presidente americano não é eleito pelo voto direto, mas por um colégio eleitoral. Cada estado possui uma delegação no Congresso: dois senadores mais um número de deputados adequado ao seu tamanho populacional. O número de votos do estado no colégio eleitoral é a sua quantidade de parlamentares no Congresso. Por exemplo, o Texas conta com dois senadores e 36 deputados, logo, terá 38 votos no colégio eleitoral. Um estado menor, como Idaho, possui 2 senadores e 2 deputados, logo, terá 4 votos. Veja o mapa abaixo com o número de votos em todos os estados:
O presidente do país é eleito pelo colégio eleitoral que funciona a partir do sistema de “winners takes all” (o vencedor pega tudo). O candidato que vencer o estado, mesmo que por apenas um voto, leva todos os votos do estado no colégio eleitoral. Por isto, um candidato pode vencer a eleições mesmo sendo menos votado. Em 2000, George W. Bush ganhou no colégio eleitoral, mas perdeu no voto popular.
No total, há 538 votos em disputa no colégio eleitoral. O candidato que conseguir 270 votos vence a eleição. Em geral, sempre há estados que são solidamente democratas e solidamente republicanos. São os chamados “swing states” que costumam decidir as eleições.
Situação eleitoral pelo Real Clear Politics
O Real Clear Politics é um site que costuma compilar artigos e pesquisas sobre a eleição americana. Eles também produzem uma média das últimas pesquisas apresentadas. No geral e em cada estado. No momento, eles resumem a situação eleitoral dessa maneira (quinta-feira, dia 4 de novembro):
Hillary tem em torno de 226 votos bem consolidados no colégio eleitoral; Trump, em torno de 180 votos. Há 132 votos em disputa em estados-chave: New Hampshire (NH), Ohio (OH), Pensilvânia (PA), Virgínia (VA), Carolina do Norte (NC), Florida (FL), Nevada (NV), Arizona (AZ), Iowa (IA) e Colorado (CO). O estado do Maine (e também Nebraska) divide seus votos em duas partes. 2 votos irão para quem ganhar a eleição no geral, um voto vai para o primeiro distrito e outro voto vai para o segundo distrito. No segundo distrito (ME2), há também uma indefinição.
Por esta projeção, Hillary precisa de mais 44 votos para ganhar a eleição, enquanto Trump precisa de 90 votos. Como as últimas pesquisas indicam consistentemente uma vantagem para o republicano em Arizona, Iowa e Ohio, podemos atualizar esses números para o seguinte quadro: Hillary tem 226 votos consolidados e precisa de 44 votos em 107 restantes, e Trump tem 215 votos consolidados e precisa de 55 votos em 107 restantes.
O favoritismo de Hillary decorre desse melhor quadro e por ter uma pequena vantagem, embora consistente, na Virginia, Colorado e Pensilvânia (o que já somaria 42 votos). A Flórida pode decidir mais uma vez a eleição como ocorreu em 2000.
Estados Democratas
Estado | Região | Average (RCP) | Última eleição | Última vitória republicana |
---|---|---|---|---|
Maine (4 votos) | Nordeste | Clinton +6.6 | Obama +15 | Bush (88) |
Vermont (3) | Nordeste | Clinton +25.6 | Obama +35 | Bush (88) |
Massachusetts (11) | Nordeste | Clinton +30.0 | Obama +23 | Reagan (84) |
Rhode Island (4) | Nordeste | Clinton +20.0 | Obama +28 | Reagan (84) |
Connecticut (7) | Nordeste | Clinton +15.0 | Obama +17 | Bush (88) |
New Jersey (14) | Nordeste | Clinton +12.5 | Obama +17 | Bush (88) |
New York (29) | Nordeste | Clinton +21.0 | Obama +28 | Reagan (84) |
Deleware (3) | Sul | Clinton +21.3 | Obama +18 | Bush (88) |
Maryland (10) | Sul | Clinton +32.6 | Obama +26 | Bush (88) |
District of Columbia (3) | Sul | Sem Pesquisa | Obama +83 | Nunca |
Michigan (16) | Centro-Oeste | Clinton +5.7 | Obama +10 | Bush (88) |
Wisconsin (10) | Centro-Oeste | Clinton +5.0 | Obama +7 | Reagan (84) |
Illinois (20) | Centro-Oeste | Clinton +16.0 | Obama +17 | Bush (88) |
Minnesota (10) | Centro-Oeste | Clinton +6.0 | Obama +8 | Nixon (72) |
New Mexico (5) | Oeste | Clinton +7.3 | Obama +10 | Bush (2004) |
Washington (12) | Oeste | Clinton +13.0 | Obama +15 | Reagan (84) |
Oregon (7) | Oeste | Clinton +8.0 | Obama +12 | Reagan (84) |
California (55) | Oeste | Clinton +22.3 | Obama +23 | Bush (88) |
Hawaii (4) | Oeste | Sem Pesquisa | Obama +42 | Reagan (84) |
A maioria dos estados da região nordeste são solidamente democratas. Isto ocorre pelo seu perfil: mais área urbana, menos áreas rurais, mais cidades grandes, menos religiosos. Um imaginário liberal consolidado. Ainda assim, dois estados na região serão disputados: New Hampshire e Pensilvânia. Os democratas também vão bem na costa oeste pelas mesmas características: cidades grandes e imaginário liberal. Eles perdem entre as duas costas, na “América profunda”, com maior presença de áreas rurais e religião.
Devido à forte presença de latinos, os democratas conseguiram vantagem no Novo México. E, se mantiverem a maior parte dessa fatia do eleitorado, podem conseguir futuramente o Arizona e o Texas. No entanto, a preferência dos latinos pelos democratas (muito devido a questões ligadas a imigração) tem caído por causa das questões sociais e morais. Ainda assim, o voto hispânico tem mostrado preferência pelos democratas moderados.
No centro-oeste, os democratas costumam ir bem na região dos “grandes lagos” (Illinois, Michigan, Wisconsin, Ohio, Minnesota), que é industrializada e com grandes centros urbanos. A classe trabalhadora tem escolhido o partido por questões econômicas (protecionismo); no entanto, nessa eleição, pelo candidato republicano ter uma plataforma econômica protecionista e um discurso nacionalista, essa tendência tem sido um pouco revertida.
As últimas pesquisas mostram queda da diferença entre Hillary e Trump em Michigan. A diferença, que já foi de dez pontos, caiu para de um a três pontos. Avaliando os dados, dá para perceber que Trump avançou nas cidades vizinhas a Detroit, onde mora a classe trabalhadora. Se os republicanos sempre perderam ali por longa vantagem, Trump vence por oito no condado onde fica Detroit (tirando a cidade). Como nas primárias, onde Sanders surpreendeu Hillary no entorno de Detroit (as pesquisas davam 20 pontos de diferença no estado), é possível que Trump repita a façanha.
Estados Republicanos
Estado | Região | Average (RCP) | Última eleição | Última vitória democrata |
---|---|---|---|---|
Georgia (16 votos) | Sul | Trump +5.6 | Romney +8 | Clinton (96) |
West Virgina (5) | Sul | Trump +18.0 | Romney +27 | Dukakis (88) |
South Carolina (9) | Sul | Trump +4.0 | Romney +18 | Carter (76) |
Alabama (9) | Sul | Sem Pesquisa | Romney +27 | Carter (76) |
Louisiana (8) | Sul | Trump +16.3 | Romney +18 | Clinton (96) |
Mississippi (6) | Sul | Trump +15.0 | Romney +11 | Carter (76) |
Arkansas (6) | Sul | Trump +23.0 | Romney +24 | Clinton (96) |
Tennessee (11) | Sul | Trump +12.0 | Romney +20 | Clinton (96) |
Kentucky (8) | Sul | Trump +17.0 | Romney +22 | Clinton (96) |
Texas (38) | Sul | Trump +10.8 | Romney +16 | Carter (76) |
Oklahoma (7) | Sul | Trump +24.0 | Romney +33 | Johnson (64) |
Indiana (11) | Centro-Oeste | Trump +9.3 | Romney +10 | Obama (2008) |
Missouri (10) | Centro-Oeste | Trump +11.8 | Romney +10 | Clinton (96) |
Kansas (6) | Centro-Oeste | Trump +11.0 | Romney +22 | Johnson (64) |
North Dakota (3) | Centro-Oeste | Sem Pesquisa | Romney +20 | Johnson (64) |
South Dakota (3) | Centro-Oeste | Trump +14.0 | Romney +18 | Clinton (96) |
Nebraska (5) | Centro-Oeste | Trump +27.0 | Romney +22 | Johnson (64) |
Montana (3) | Oeste | Trump +20.0 | Romney +13 | Clinton (92) |
Wyoming (3) | Oeste | Sem Pequisa | Romney +41 | Johnson (64) |
Idaho (4) | Oeste | Trump +19.0 | Romney +32 | Johnson (64) |
Utah (6) | Oeste | Trump +11.3 | Romney +47 | Johnson (64) |
Alaska (4) | Oeste | Trump +3.0 | Romney +15 | Johnson (64) |
Nas últimas décadas, a base do eleitorado republicano vem das áreas rurais, dos subúrbios, dos protestantes, do branco escolarizado. No entanto, se Romney venceu entre graduados e perdeu entre os que só possuíam o High School, Trump, faz o inverso, tendo o seu melhor desempenho entre os menos escolarizados. O Partido Republicano perdeu o branco escolarizado da cidade grande (que votou por Rubio e Kasich nas prévias), mas ampliou sua base na classe trabalhadora branca. Trump também alcança mais latinos do que Romney, provavelmente por questões morais. E a maior diferença é entre os católicos. Se Romney perdeu para Obama por 2 pontos em 2012 nesse segmento, Trump vence Hillary por mais de 10 pontos.
Apesar do Partido Republicano vencer em mais estados, estes costumam ser menores por não ter grandes centros urbanos e possuir mais áreas rurais. Os republicanos vão melhores no sul e no centro do país. O número de votos de estados republicanos consolidados é menor do que os democratas e isto ocorreria independente dos candidatos de ambos os partidos.
Embora o estado do Arizona seja tradicionalmente republicano, há uma expectativa de que se torne democrata, até mesmo com uma pequena chance de isto ocorrer já nesta eleição. Há um crescimento do eleitorado hispânico no estado. No entanto, os republicanos também estão ampliando sua base entre os latinos. Atenção também para o Alaska e a Geórgia. Surpresas negativas para os republicanos podem vir de lá.
“Swing States”
Estados | Região | Average (RCP) | Última eleição | Última vitória democrata/republicana |
---|---|---|---|---|
Pensilvânia (20 pontos) | Nordeste | Clinton +3.0 | Obama +6 | Obama (12)/Bush (88) |
New Hampshire (4) | Nordeste | Trump +1.5 | Obama +6 | Obama (12)/Bush (04) |
Ohio (18) | Centro-Oeste | Trump +3.3 | Obama +2 | Obama (12)/Bush (04) |
Iowa (6) | Centro-Oeste | Trump +1.4 | Obama +6 | Obama (12)/Bush (04) |
Virginia (13) | Sul | Clinton +5.2 | Obama +4 | Obama (12)/Bush (04) |
North Carolina (15) | Sul | Trump +0.8 | Romney +2 | Obama (08)/Romney (12) |
Florida (29) | Sul | Clinton +1.2 | Obama +1 | Obama (12)/Bush (04) |
Colorado (9) | Oeste | Clinton +2.6 | Obama +5 | Obama (12)/Bush (04) |
Arizona (11) | Oeste | Trump +4.0 | Romney +9 | Clinton (96)/Romney (12) |
Nevada (6) | Oeste | Trump +2.0 | Obama +6 | Obama (12)/Bush (04) |
Esses estados costumam decidir a eleição. Este está sendo o padrão desde 2000. Trump é favorito em New Hampshire, Ohio, Iowa e Arizona. Hillary é favorita na Pensilvânia, na Virginia e no Colorado. Nevada, Carolina do Norte e Flórida possuem um cenário extremamente apertado e indefinido. Vencendo nesses 3 estados (PA, VA, CO), Hillary precisará de apenas mais um estado. O caminho para Trump é confirmar os 4 estados (AR, IA, OH, NH) em que é favorito e ganhar também Nevada, Carolina do Norte, Flórida e mais um distrito do Maine. Assim, terá 270 pontos. Um a mais do que precisa.
É provável que Hillary obtenha Pensilvânia, Virgínia e Colorado. Como é provável que Ohio, Iowa, Arizona e New Hampshire vão para Trump. A decisão fica nos outros três estados, só que Trump precisa de todos eles e Hillary só de um. É possível também que ocorra um empate no colégio eleitoral. Nate Silver define assim o caminho de ambos para a vitória:
Surpresas também podem acontecer em estados que são, em tese, democratas ou republicanos. Chamo atenção para Michigan e Alaska. A apuração deve começar por volta das 22 horas (horário de Brasília).
Minha aposta
Observando apenas os números, daria 60% de chances de vitória para Hillary. É muito possível que o voto latino faça diferença na Flórida a favor da democrata. No entanto, surpresas podem vir do norte. Hillary é a favorita, mas Trump tem a favor dele um maior entusiasmo. As pesquisas sempre deram sistematicamente seu percentual de votos abaixo do das urnas durante as primárias. O inverso se deu com Hillary. Então, minha aposta é: Trump 276 x Hillary 262. Com duas surpresas para o republicano: Michigan e Pensilvânia.
Elton Flaubert
Doutor em História pela UnB.