Uma lembrança viva do fracasso da revolução chavista

Gente como Maria Corina e Leopoldo López não pode ir a bairros pobres fazer contato com o povo.

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Tenho uma teoria sobre por que Maria Corina Machado irrita tanto os chavistas.

Não, não tem a ver com seu gênero. Já testei essa hipótese antes, mas ela não me deixa inteiramente satisfeito. A oposição tem outras líderes, mas nenhuma é tão controversa quanto Maria Corina.

A questão também não é o que ela diz. As pessoas adoram a conversa de que Maria Corina é “linha dura” ou “radical”, mas, para ser honesto, eu ainda estou para ver como qualquer coisa que ela diz possa ser controverso o bastante para merecer múltiplos desejos de morte. Claro, ela se opõe a Maduro com paixão, mas… nós todos não fazemos o mesmo?

Certamente a questão não é seu poder. Ela foi chutada para fora do Parlamento sob alegações frágeis, e foi proibida de deixar o país. A mídia a evita. Ela tem pontos fracos, e não é a liderança mais popular da oposição. Por que apresenta uma ameaça?

Para mim, tem a ver com algo que ela compartilha com Leopoldo López, outro nêmesis do chavismo: ambos vêm da antiga elite, mas, ainda assim, são relevantes.

O chavismo é uma revolução, revolução provavelmente assentada em ressentimentos étnicos e culturais enraizados, como o falecido professor Briceño Guerrero nos ensinou. A raiz visceral do chavismo é o “nós” contra “eles”, e deve-se supor que “nós” estejamos ganhando. Mas quem exatamente são “eles”?

Uma teoria inicial é que “eles” significam o antigo regime, os corruptos e insaciáveis partidários dos dois grandes partidos que governaram até que Chávez subiu ao poder. Mas alguém vê chavistas indo para cima de Ramos Allup? Carlos Andrés Pérez é, para eles, uma memória distante.

Além disso, os membros dos antigos partidos não são mais relevantes. Eles foram derrotados há muito tempo, ou incorporados à revolução. No fundo, parte deles era como os chavistas – uma geração separada da pobreza, gente da classe média móvel que se utilizou do patrocínio do Estado para subir na sociedade. Os chavistas não podem odiá-los, porque são muito parecidos.

Quanto a Caprilles… é verdade, os chavistas o detestam, mas ele vem de imigrantes, de modo que o ódio parece não ir tão fundo.

Com Maria Corina Machado é diferente. Machado e López têm origem nos aristocratas que governaram a Venezuela. São membros das famílias mais antigas do nosso país. Eles descendem de pessoas que provavelmente escravizaram os ancestrais dos chavistas de hoje, e raramente se misturavam com as classes inferiores. Eles são, para citar Herrera Luque, os “amos del valle”, os senhores do vale, os “oligarcas”.

O ódio contra Maria Corina – existe outra palavra para definir o sentimento? – nasce do fato de que, apesar desta ser uma revolução para vingar todos que foram oprimidos por “aquelas pessoas”, Maria Corina e Leopoldo recusam-se a se deixar intimidar. Eles recusam-se a silenciar, sentar e afundar no esquecimento. Eles tomaram uma atitude e disseram “basta”.

Não é assim que se espera que uma Revolução se desenrole. É como se, na Rússia de 1929, um Romanov ainda estivesse vagando, criticando a opressão dos soviéticos.

Maria Corina é um alvo porque gente como ela e Leopoldo não deve ir até bairros pobres e conversar com a gente comum. Eles não devem aparecer na TV, não devem estar no Parlamento. Eles podem estar em Mustique ou Gstaad, Vail ou Chamonix, aproveitando sua poupança e lamentando o estado de seu antigo país. Mas certamente não devem estar em bairros como Sabaneta ou Guasdilito, inflamando a multidão.

O fato de que eles ainda estejam de pé, ainda lutando por seus ideais, sem entrar em acordo com o chavismo, recusando as caricaturas que o folclore revolucionário tenta pregar em suas pessoas… isso é um insulto aos chavistas.

A sobrevivência de opositores desse tipo é uma lembrança do fracasso da revolução. É por isso que existe tanto ódio contra eles.

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  • Bosco Ferreira

    http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/urariano-mota-na-falta-de-papel-higienico-vamos-exportar-veja-para-cuba.html